A quarta audiência pública da Comissão Especial criada para atualizar a legislação de proteção contra incêndios reuniu, na noite de segunda-feira (18), no Plenarinho da Assembleia Legislativa, dois especialistas brasileiros da Sociedade de Engenharia do RS (SERGS), João Daniel Xavier Nunes e Cláudio Alberto Hanssen, e o engenheiro norte-americano Russ Fleming, que acompanhou os trabalhos realizados pelas autoridades americanas no incêndio ocorrido em 2003, na boate “The Station”, no estado de Rhode Island (EUA).
O primeiro a se manifestar foi o engenheiro João Daniel, que defendeu a atualização da legislação. “Eu penso que a proteção contra incêndio não deve ser fixada em lei”, disse ele. “A lei tem que determinar os parâmetros. Sua regulamentação pode ser feita por regramentos ou decretos, para não haver engessamento. Existem diversos itens da legislação que já estão atrasados. A tecnologia e ocupação dos imóveis atropelou isto. Tratando da legislação estadual, ela já se encontra defasada, pois já faz 15 anos desde o último regramento”, acentuou.
Para ele, o Sistema Integrado de Gestão contra Incêndio eliminou o projeto físico. “Com isto, em caso de sinistro não dá nenhuma orientação do tipo de prédio que se encontrará pela frente. Deve existir uma padronização em todo o estado”. Para o engenheiro, de todo modo, sem a devida fiscalização, nada ajudará na segurança.” Em momentos de crise financeira, é sempre o sistema de proteção contra incêndio que é cortado”, criticou.
Americano defende chuveiros automáticos
Os chuveiros automáticos ou sprinklers, que jogam água no ambiente ao primeiro sinal de fogo, devem ser instalados em todos os estabelecimentos em que circulem mais de 50 pessoas. São equipamentos indispensáveis e eficazes para evitar a propagação de incêndios, disse o engenheiro norte-americano Russ Fleming, que também participou da audiência pública da Comissão Especial.
Fleming acompanhou as providências legislativas e técnicas encaminhadas pelas autoridades americanas após a tragédia da boate The Station, em 2003, em Rhode Island, quando mais de 100 jovens morreram em um incêndio, e trouxe lições e alertas importantes para os gaúchos.
O especialista observou que nem a boate de seu país, nem a Kiss, de Santa Maria, possuíam sprinklers que, após a tragédia em Rhode Island, passaram a ser obrigatórios em três estados americanos e no município de Nova Iorque, em clubes ou casas noturnas com mais de 50 ocupantes. Em Mariland e na Califórnia, as residências novas precisam ter chuveiros automáticos.
Em nível federal, nos Estados Unidos, os sprinklers são obrigatórios em hospitais e em asilos que reivindiquem verbas federais. “Mesmo que não seja uma tecnologia nova e, ao contrário, é bem simples, o sprinkler é a melhor solução, porque corrige deficiências do sistema de proteção”, afirmou o engenheiro, que exibiu vídeos de simulações de incêndios com os equipamento, preservando o nível de oxigênio do ambiente, e sem os chuveiros automáticos.
“Mantida em encanamento pressurizado, a água é acionada em dois ou três sprinklers, de acordo com grau de calor, diretamente sobre o incêndio, controlando-o em pequenas proporções, sem que chegue a dimensões perigosas”, argumentou ele.
“E o controle de fumaça não é importante?”, indagou, para responder que a fumaça é produzida pelo próprio fogo. “Portanto, é o fogo que tem que ser atacado antes”, salientou. As leis, na opinião de Fleming, precisam ser reformuladas, com a obrigatoriedade do uso dos sprinklers e proibição de fogos de artifício, devendo-se considerar ainda a capacidade de rotas de fuga, o adequado treinamento das pessoas envolvidas e a disponibilidade de extintores.
Especialista diz que responsáveis também precisam de atualização técnica
Para o RS ter legislação melhor, oferecendo mais segurança para as pessoas, não é só a lei que tem que ser atualizada. Na opinião do especialista da Sociedade de Engenharia do RS (SERGS), Cláudio Alberto Hanssen, os responsáveis pela proteção contra incêndios, como os profissionais de prefeituras, precisam se atualizar obrigatoriamente. “É preciso estímulos e subsídios para viagens e para leitura de revistas técnicas; é necessário reservar verbas para isto”, disse o engenheiro.
Hanssen apresentou sugestões de vários procedimentos, como o valor do sistema de extração para fumaça que considera necessário “porque o que mata, com o uso excessivo dos plásticos, é a fumaça”. O engenheiro acha que o pé direito de uma casa noturna deve ser elevado e não pode ser diminuido com a mudança do tipo de uso do imóvel. Hanssen defende, também, o uso de extintores de água, antigos, mas baratos e diretos. “Pode ser mais eficiente porque molha”, disse.
Segundo Hanssen, à exceção de Porto Alegre, quase todos municípios abdicaram da legislação própria e conveniaram com o Corpo de Bombeiros. Em Marau, é o Corpo de Bombeiros voluntário, com engenheiro contratado pelo município, que examina projetos e libera o funcionamento. A comunidade local tem que se integrar nos exames de projetos de proteção contra incêndios e na fiscalização”, prega ele. “Proteger contra incêndios é salvar vidas”, afirmou Hanssen, que define como exemplar a legislação do estado de São Paulo, que é atualizada a cada cinco anos, a última vez em 2011.
Presidida pelo deputado Adão Villaverde (PT), a Comissão Especial tem como um dos seus integrantes o deputado Valdeci Oliveira (PT), que elogiou o alto nível das palestras. “Muitas contribuições para o aperfeiçoamento da legislação gaúcha saíram hoje daqui”, afirmou. Os vereadores Cláudio Rosa (PMDB), Sérgio Cechin (PP) e Jorge Trindade (PT), que integram a Comissão da Câmara de Santa Maria responsável por revisar a legislação da cidade, participaram da atividade na Assembleia.
Texto: André Pereira /Tiago Machado – Foto: Tiago Machado