No trajeto de Valdeci

2010reportagemDSM1Ao pegar um ônibus do Centro para a Tancredo Neves, o deputado estadual eleito e ex-prefeito de Santa Maria relembrou sua caminhada política

Havia algum motivo para aquela senhora abanar para o ônibus da linha Tancredo Neves. Do pátio de casa, na beira da BR-287, ela percebeu que quem estava na janela era a mesma pessoa que estampava um pequeno outdoor de campanha no outro lado da faixa.

– Olha lá! É o Valdeci! – disse a senhora, com o dedo apontado para o ônibus, chamando atenção de outra pessoa da mesma casa.

Se tivesse visto, Valdeci Oliveira (PT) teria respondido com o cumprimento de positivo que adotou – mão fechada com o dedão para cima. Na última quarta-feira, a convite do Diário, o ex-prefeito de Santa Maria, que se elegeu deputado estadual no dia 3, pegou um ônibus na Rua Professor Braga, no Centro, para reviver o trajeto que fez muitas vezes até a Cohab Tancredo Neves, onde ainda mora. Quando virou prefeito, em 2000, ele andava com motorista – não tinha carteira de habilitação. Quando saiu do gabinete, após dois mandatos, resolveu fazer a habilitação. Foi aprovado na segunda tentativa, mas ainda prefere andar na carona do carro.

Ao chegar à parada de ônibus no Centro, Valdeci, 53 anos, cumprimentou quem dirigiu olhar a ele e entregou um cartão de agradecimento: “Quando caminhamos juntos, a vitória é de todos nós”. O “todos nós”, nesse caso, reúne os 64.158 eleitores que votaram nele no Estado, incluindo os 46.527 só em Santa Maria. É um placar de votos que já estabeleceu o novo recorde de um candidato da cidade a deputado estadual.

Não chega a ser surpresa diante dos índices com que Valdeci deixou a prefeitura em 2008 – em pesquisa encomendada pelo Diário em 2008, 39, 3% dos eleitores avaliaram seu governo como regular, 33,9%, como bom, e 8,3%, como ótimo. Mas revela que seu eleitorado é grande, considerando a vitória apertada de 869 votos de diferença sobre Cezar Schirmer (51.932 contra 51.063) na reeleição em 2004:

– Quando um prefeito sai depois de oito anos, normalmente há um desgaste. Acho que a votação que recebi é uma avaliação altamente positiva. Concorri com vários. Tive uma campanha simples, com o engajamento da minha mulher, das minhas duas filhas e do pessoal próximo a mim. Ser o mais votado da história de Santa Maria é uma resposta que me orgulha e me deixa ainda mais comprometido com a cidade – diz.

No fim da fila – Valdeci é um rosto lembrado e conhecido, mas procura se manter no mesmo nível de todos. Na parada de ônibus, depois de panfletear, dirigiu-se ao final da fila, respeitando a ordem de chegada. Enquanto o ônibus não aparecia, muitas pessoas aproveitaram a proximidade para cumprimentá-lo pela eleição.

– O senhor nos agradeceu, mas é nós que temos de agradecer de estar novamente trabalhando para a gente – completou uma senhora.

No fim do mandato de prefeito, Valdeci resolveu sair pela tangente quando precisava definir sobre um novo aumento da passagem aprovado pelo Conselho Municipal de Transportes e deixou o assunto para seu sucessor. Quando saiu da prefeitura, em 1º de janeiro de 2009, a passagem custava R$ 1,80. Em março de 2009, o prefeito Schirmer acatou a proposta de aumento para R$ 2. Agora, ele deve decidir sobre um novo reajuste.

O ex-prefeito sabe como é a pressão das empresas de transporte urbano. Mas será que aprovaria novo aumento caso fosse prefeito?

– Agora sou usuário. Não gostaria que aumentasse – despistou.

2010reportagemDSM2Ao chegar na Tancredo Neves, Valdeci desembarca na parada do Centro Comercial. Antes de atravessar a Avenida Paulo Lauda, é chamado pela buzina de um carro e por pedestres. Dali até a sua casa, são poucas quadras. Nesse trajeto, a mão dele será apertada por mais de uma dezena de pessoas.

– O mais importante para mim é me chamarem de Valdeci e não de prefeito ou deputado. Não tenho frescura. Não sou melhor que ninguém – diz.

A mesma casa – A casa onde Valdeci mora há 24 anos com a família ganhou um segundo piso quando ele estava na prefeitura. Na declaração de bens para a eleição, constam a casa (avaliada em R$ 100 mil) e um Ford KA 2009 (R$ 27 mil). O apoio familiar é importante.

– O tempo que eu tenho para minha vida é extremamente pequeno, eu praticamente não vi minhas filhas crescerem. Em toda essa minha caminhada, é fundamental o apoio da família – conta.

Antes, Valdeci e a família moraram na Vila São João Batista, onde ele começou a se destacar como líder comunitário ao reivindicar condições e melhorias.

– Era uma vila que não tinha nada, era desconhecida. Fizemos um belo trabalho quando começamos a pedir escolas, ruas…

Como prefeito, o petista avalia suas duas gestões com um trabalho voltado a obras e as boas relações com o povo.

– Depois das obras, acho que o mais importante do meu período como prefeito foi humanizar as relações do poder público com a sociedade. A coisa de eu ser o prefeito e, ao mesmo tempo, não ter diferenças. Fui prefeito por oito anos e pegava ônibus, andava de telemoto, jogava futebol…

Durante o comando da prefeitura, Valdeci fez vestibular para História. O estudo, no caso dele, tem o valor de quem só terminou o Ensino Médio por meio do supletivo. Ele tinha 36 anos, era vereador e estava se candidatando a deputado federal, em 1994. Por conta da campanha eleitoral à Assembleia, Valdeci parou a faculdade no sétimo semestre, mas pretende concluí-la:

– Meu grande desejo é alfabetizar adultos. Minha mãe é analfabeta. Ela só sabe assinar o nome e escrever alguma coisa porque nós (os filhos) ensinamos.

Diário de Santa Maria – 16/10/2010 | N° 2635

ESPECIAL (FRANCISCO DALCOL)

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