Por Valdeci Oliveira –
Não há luta que, quando justa, não valha a pena. E não existem barreiras que se tornem intransponíveis quando há união e soma de esforços. O caso do Hemocentro Regional de Santa Maria, cuja manutenção e continuidade dos trabalhos será mantido, é um ótimo exemplo.
A garantia oficial da permanência do funcionamento da unidade, a partir de um novo convênio cuja minuta está sendo elaborada, nos foi dada na última quarta-feira, 23, pela própria secretária estadual da Saúde, Arita Bergmann, durante a audiência pública realizada pela Comissão de Saúde e de Meio Ambiente da Assembleia Legislativa.
Mas o risco da precarização do serviço era, apesar de algumas negativas públicas, concreto na vida real. Não fosse a mobilização dos servidores do Hemocentro, um conjunto de trabalhadoras e trabalhadores vinculados à própria Secretaria Estadual, à Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) e a empresas terceirizadas, e que encontraram eco junto à imprensa santa-mariense, à Câmara de Vereadores, ao Ministério Público Estadual e ao Parlamento gaúcho, muito provavelmente o desfecho seria outro.
Já tinha algumas semanas que, à boca pequena, em diálogos tratados entre gabinetes localizados em Porto Alegre e em Santa Maria, era ventilada essa possibilidade, o que certamente resultaria em claros prejuízos à saúde pública não só de Santa Maria, mas de outros 39 municípios da Região Central que são atendidos pelo qualificado trabalho do Hemocentro. O que estava em jogo era o acesso a serviços de coleta de sangue, processamento, armazenamento e distribuição de hemocomponentes, realização de provas imunohematológicas, entre outras atividades, para mais de uma dezena de hospitais numa área que abriga cerca de 1 milhão de pessoas.
Quando prefeito de Santa Maria acompanhei de perto as tratativas, as formatações técnicas necessárias e a cedência do local que viria a ser o Hemocentro Regional, criado justamente para atender as necessidades regionais no que se refere à disponibilidade de sangue e seus derivados. Isso foi há 13 anos, e desde então a sociedade como um todo recebeu a devida atenção nesse aspecto.
Numa clara tentativa de inversão da realidade, cheguei a ser criticado por algumas vozes por ter solicitado a realização da audiência, como se isso fosse o real problema, como se trazer à tona uma questão de interesse social redundasse em prejuízos à coletividade. O fiz, e o faria novamente, justamente para colocar o debate em público, para buscar a transparência e a clareza necessárias sobre um assunto sério e que estava sendo tratado fora do radar da imensa maioria da população. Realizamos a audiência para dar voz aos que se dedicam a essa nobre atividade, como a nossa UFSM (por meio do HUSM) e o conjunto de trabalhadoras e trabalhadores do Hemocentro Regional.
Foi durante a audiência que ficamos sabendo que o convênio entre o Estado e a Universidade necessitava ser regularizado. Foi a partir do debate que tivemos o conhecimento de que o Ministério Público Estadual havia instaurado um procedimento para averiguar a possibilidade de fechamento da unidade. Foi a partir do debate que ficamos sabendo, pelas palavras do próprio reitor da UFSM, Paulo Burmann, de que este já havia, em governos passados, tentado, sem sucesso, essa equalização, mas que fora “metralhado e engoliu em seco” para que os serviços do Hemocentro continuassem sendo realizados. E mesmo sendo questionados por um órgão de fiscalização, os dirigentes da Universidade “seguraram no braço e com a cabeça na guilhotina”, de acordo com o reitor, pois não podiam abrir mão do compromisso assumido com a saúde da população. Também veio de Burmann a fala de que, sim, havia risco concreto de, no mínimo, haver precarização e risco na quantidade e qualidades dos serviços, pois o HUSM teria de acabar com as cedências dos seus profissionais ao Hemocentro.
Fora isso, o desejo de fechamento, conforme soubemos, também chegou a ser manifestado pelo Estado, em setembro do ano passado, o que causou apreensão entre os servidores, e nos motivou, assim que tivemos ciência disso, a levar o caso ao conhecimento da Comissão de Saúde e Meio Ambiente da Assembleia Legislativa.
Mas o importante agora é comemorarmos esse saldo positivo trazido pela mobilização, uma vitória numa batalha que só é menor se comparada à guerra em defesa da saúde como um todo. O nosso mandato tem lado e ele continuará comprometido com a defesa do SUS e, assim como lutamos pela abertura de leitos no Hospital Regional de Santa Maria, lutaremos pelo fortalecimento do Hemocentro e da política estadual de sangue e hemoderivados.
Agora é vacina no braço, comida no prato e muita solidariedade, além de continuarmos nos organizando contra os cortes de verbas da UFSM e demais universidades federais e pela derrubada da EC 95, que ceifa anualmente bilhões de investimentos governamentais nas áreas essenciais. Acredite: a boa luta sempre vale a pena.
(Artigo originalmente publicado no site www.claudemirpereira.com.br)