Por Valdeci Oliveira –
Em tempos de recessão e de pouca atividade econômica como o que temos vivido no último período, a receita, defendida inclusive por muitos economistas liberais, é de que é necessário fomentar o consumo e assim fazer girar a roda da economia. Mais consumo significa mais produção, geração de impostos e de empregos.
E é neste sentido que cabe discutirmos – e defendermos – a importância do piso regional e a manutenção de seu poder de compra. É fundamental também destacarmos que todo ganho, cada centavo direcionado ao piso regional é imediatamente devolvido ao mercado, incrementando as vendas do pequeno ao grande negócio. De forma prática, significa aquecer os segmentos da indústria e dos serviços, ou seja, toda uma cadeia produtiva que reflete positivamente no comércio local, no mercadinho do bairro, na padaria, na farmácia, da loja de roupas.
Atualmente são cerca de 1,5 milhão de gaúchos e gaúchas que recebem o piso regional. São mães e pais de família que pertencem a categorias profissionais menos organizadas e que não possuem acordos coletivos ou piso salarial definido em lei federal.
Para esse ano, o governo estadual encaminhou para a Assembleia Legislativa projeto concedendo ao piso regional apenas a reposição da inflação acumulada em 2018, ou seja, 3,43%. Com esse índice a menor das faixas salariais passaria dos atuais R$ 1.196,47 para R$ 1.237,15. Ora, todos nós sabemos que na vida real, com a gasolina subindo semanalmente, assim como o gás de cozinha, a luz, os remédios e os alimentos, o INPC nunca refletiu o peso que realmente as pessoas sentem nos seus bolsos e nas suas vidas. Além do mais estamos falando de parcos R$ 1.237,15, valor que ninguém em sã consciência pode afirmar ser um valor alto, proibitivo de ser pago ou, pior, causador de desequilíbrio econômico-financeiro para as empresas.
Não é pagando menos a quem trabalha que iremos recuperar a nossa economia. Exemplo disso é que mesmo aprovando a lei das terceirizações e a reforma trabalhista, ambas medidas que retiraram inúmeros e importantes direitos – e ganhos – da classe trabalhadora e tornaram a mão de obra muito mais barata para quem contrata – com reflexo direto no aumento dos lucros das empresas – não se gerou os milhões de empregos prometidos. Mesmo com a terceirização em pleno vapor e as diminuições dos encargos e responsabilidades trabalhistas do patronato, temos hoje perto de 14 milhões de desempregados no Brasil. Se somarmos aquilo que é chamado de “desalento”, ou seja, pessoas que simplesmente pararam de procurar emprego, essa cifra chega perto de 25 milhões de pessoas.
Além disso, números oficiais do próprio governo federal mostram que os empregos criados no último período resultaram num salário médio de admissão em fevereiro de R$ 1.559,08, enquanto a média na demissão foi de R$ 1.718,79. Se descontarmos a inflação medida pelo mesmo INPC, houve queda de R$ 67,13 (-4,13%) no salário de contratação. Ou seja, quem entrou ou retornou ao mercado de trabalho o fez ganhando menos do que aqueles que saíram.
Repor apenas a inflação – abaixo do aumento de 4,61% aplicado no salário mínimo nacional – como quer o chefe do executivo estadual Eduardo Leite em atendimento à classe empresarial, faz com que o atual governador permaneça com a mesma política do seu antecessor, que desvalorizou o piso regional e praticamente relegou à própria sorte quem realmente produz a riqueza do nosso estado.
É importante que não nos esqueçamos que a maior parte do impacto de crises econômicas no mercado de trabalho ocorre sempre junto àqueles com menor remuneração, sustenta levantamento feito pelo Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas.
O índice proposto por Leite está muito aquém do reivindicado pelas centrais sindicais, de 8,43%, apresentado a partir de estudo elaborado pelo sério e idôneo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), para de fato recuperar o poder aquisitivo do chamado piso regional.
Aplicar uma política que vá além da reposição inflacionária reflete no ganho coletivo, de toda a sociedade: o trabalhador com melhor salário, o empresário comercializando e produzindo mais e o Estado ampliando sua arrecadação que, em última análise, lhe permite ainda ampliar os investimentos em saúde, segurança, educação e infraestrutura.
Além da questão econômica, a manutenção do poder de compra dos trabalhadores e trabalhadoras gaúchas é uma questão de justiça social e um importante e poderoso instrumento de distribuição de renda.
Nunca é demais lembrar que vivemos em um país absolutamente desigual, que figura entre aqueles com a pior distribuição de renda no mundo e onde cinco bilionários concentram em suas mãos um patrimônio equivalente à renda da metade mais empobrecida dos brasileiros. Ou ainda: um trabalhador que ganha um salário mínimo mensal precisar trabalhar 19 anos – e não gastar um único centavo – se quiser ter a mesma quantia ganha em um único mês por um dos integrantes do chamado grupo do 0,1% mais rico.
Isso é Justiça?