A Legalidade, Brizola e a política

Frequentemente ouço aqui e ali uma perigosa tentativa, às vezes ingênua, às vezes nem tanto, de se satanização da política. Reparem os leitores também se muitas vezes não é comum escutar de algum amigo ou de algum parente a frase “Nenhum político presta”. Ou pior: “Todo político é ladrão”. Sentenças como essas repetidas de forma coletiva e quase sempre sem contestação acabam infelizmente sedimentando pensamentos e opiniões que colocam todos no mesmo nível e nada contribuem para o avanço da democracia. Infelizmente hoje o debate e o noticiário político em suma se baseiam em denúncias, em investigações e em fatos policiais, que merecem sim ampla divulgação, mas que não deveriam expressar a quase totalidade das iniciativas políticas. Hoje o debate público sobre a política sofre uma semi interdição apesar da total midiatização existente. Hoje em dia se alguém falar em público que quer debater ou discutir sobre política corre risco de ser corrido do ambiente em que estiver. Porém, o que chama a atenção é que muita gente que interdita o debate sobre a política, se interessa e muito por melhorias no seu bairro, na sua rua, entre outras medidas, que dependem da ação política. Muitas vezes, a mesma pessoa que se indigna com os desvios éticos, não fica com vergonha de pedir um favor aqui e ali para alguma autoridade em benefício próprio. Não há corrupto, sem corruptor. Não há eleito, sem eleitor. E em todos os setores da sociedade há os bons e os maus. Na política, não é diferente.

Falo isto para chegar a um exemplo marcante de grandiosa ação política registrado em nosso Estado há 50 anos, quando aqui se registrava um cenário inversamente proporcional ao de hoje quando falar em política é feio, é chato ou “não cai bem”. Em 1961, no nosso Estado e depois país afora, se sucedeu o Movimento da Legalidade, capitaneado pelo então governador Leonel Brizola e uma série de lideranças. Este movimento, articulado em vários frentes – ação política, respaldo popular e até mesmo mobilização de tropas da Brigada Militar e do Exército do Rio Grande do Sul – evitou nada menos que um golpe no país. E ao mesmo tempo garantiu também a posse do vice-presidente da República, João Goulart, após a renúncia do Presidente Jânio Quadros, contra a vontade das elites brasileiras e de setores conservadores que conspiravam uma virada de mesa institucional. Indo mais além, como bem lembrou o governador Tarso Genro – na sessão solene de início das comemorações do Sesquicentenário da Legalidade no plenário da Assembleia Legislativa na última quarta-feira – o movimento da Legalidade evitou nada menos que uma guerra civil que estava desenhada para ocorrer no Brasil. Guerra esta que produziria incontáveis vítimas humanas e anos de atraso ao país. Infelizmente, anos depois a ditadura se instaurou no país. Mas só aconteceu em 1964 e não em 1961 porque orgulhosamente a Legalidade impediu o regime de exceção.

O exemplo didático de como a política pode proporcionar iniciativas grandiosas de profunda transformação da realidade deixada pela Legalidade deve ser muito lembrado, como está sendo aqui no Estado por iniciativa do Palácio Piratini, da Assembleia Legislativa e pelos veículos de comunicação. Este movimento foi fruto de uma profunda efervescência política que jamais deve ser contida ou congelada. Se a sociedade em 1961 tivesse ficado amorfa, a vontade de uma minoria poderosa e rica teria se sobreposto a vontade popular sem parcimônia.

Então, jovens, recriminem e se indignem mesmo quando lerem notícias sobre um político envolvido em falcatruas ou sobre movimentos de bastidores de agentes políticos que tentam frear o combate a corrupção para manter privilégios. Mas jamais deixem que fatos, indivíduos ou escândalos suplantem aquilo que é o nobre numa sociedade democrática como a nossa: o envolvimento e a participação na política, na boa política, na política da Legalidade.

Valdeci Oliveira -deputado estadual (PT)