Relatório da Comissão Especial da Enfermagem é aprovado com 25 conclusões e encaminhamentos

O relatório final da Comissão Especial criada na Assembleia Legislativa para debater a implementação do piso salarial da enfermagem e as condições de trabalho da categoria no RS, foi aprovado por unanimidade nesta terça-feira (12) durante reunião ordinária do colegiado. Segundo o texto, elaborado pela deputada Patrícia Alba, a medida avaliada como a mais urgente, tanto pelos trabalhadores da saúde como pelas entidades sindicais representativas, deliberada nos 11 encontros regionais realizados pelo estado entre os meses de abril e julho, foi a ampliação da mobilização pela aprovação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 19/2024, que desvincula o piso salarial da jornada de 44 horas semanais, estabelece carga horária máxima de 30 horas, assegura a irredutibilidade dos vencimentos e prevê reajustes anuais aos profissionais.

Propósito desfigurado – O relatório indica que a implementação da Lei 14.434/2022, que garantiu um pagamento mínimo à categoria da enfermagem (R$ 4.750 para enfermeiros e valores proporcionais de 70% para os técnicos e 50% auxiliares e parteiras), aprovada em 2022 pela Câmara dos Deputados, revelou-se parcial e insuficiente. A legislação chegou a ser contestada pela classe patronal junto ao STF, que reconheceu a constitucionalidade da proposta, mas impôs diversos condicionantes que dificultam a sua aplicação e possibilitam interpretações distintas, desconfigurando seu propósito. Segundo o texto, em grande parte das instituições de saúde do RS o valor vem sendo pago como um complemento, sem incorporar os valores ao salário-base dos trabalhadores, o que vem gerando prejuízos diretos aos profissionais, especialmente em situações de afastamento por doença, quando os benefícios previdenciários são calculados com base em um salário inferior ao valor efetivamente recebido. “Percebemos que, na prática, o piso está se transformando em teto. E o complemento fica de fora dos demais reflexos (ganhos), seja para hora-extra ou aposentadoria. E essa é uma das grandes preocupações”, avaliou Alba.

Repasse de 11 bi – Além disso, durante as audiências públicas foram registradas muitas divergências, pois enquanto algumas gestões descontam encargos como INSS, FGTS e Imposto de Renda, outras repassam o valor líquido, sem recolhimento, o que amplia a insegurança jurídica tanto para a enfermagem quanto para empregadores, situação que poderá, inclusive, gerar passivos trabalhistas no futuro. Mensalmente, a partir das informações prestadas pelos estabelecimentos públicos e filantrópicos, o Ministério da Saúde repassa a estados e municípios valores para que o piso seja alcançado. Em 2024, essa transferência alcançou R$ 10,5 bi, e, de janeiro a junho deste ano, foram R$ 4,6 bi, devendo chegar a R$ 11 bi até o final de 2025. O RS foi contemplado com R$ 736 milhões no ano passado. Já os encargos trabalhistas e previdenciários são de responsabilidade dos empregadores.

Raio x da situação – As conclusões e encaminhamentos – 25 ao todo – foram elaborados depois de quatro meses de trabalho, que incluiu a realização de audiências públicas nos municípios de Cruz Alta, Pelotas, Bagé, São Gabriel, São Borja, Cachoeira do Sul, Santa Maria, Santa Rosa, Passo Fundo, Caxias do Sul e Porto Alegre -, além de visitas técnicas a hospitais e instituições de saúde. “Ao criarmos a Comissão Especial, buscamos fazer um ‘raio-x’ da situação no RS e propor encaminhamentos visando equacionar o problema, que tem resultado em perdas salariais para o segmento”, afirmou o deputado Valdeci Oliveira, presidente da Comissão Especial e proponente dos trabalhos. Ainda de acordo com Valdeci, outros problemas foram detectados pelos deputados, como em relação às condições de trabalho, consideradas preocupantes, como jornadas exaustivas, acúmulo de vínculos empregatícios, ausência de espaços adequados para descanso, situações recorrentes de assédio moral e um elevado índice de adoecimento mental, incluindo casos de depressão, ansiedade e síndrome de burnout. “A conquista da lei do piso veio depois de décadas de luta. Mas ela somente será definitiva se sua aplicação for feita de forma ampla, respeitando as 30 horas semanais, com reajuste anual e incorporado aos salários”, pontuou o parlamentar. “Uma pauta importantíssima para valorizar a vida”, acrescentou o deputado Pedro Pereira na justificativa do seu voto.

Subfinanciamento do SUS – Na questão orçamentária, foram destaque a insuficiência do investimento público na saúde, trazendo como exemplos o não cumprimento do mínimo constitucional de 12% em saúde pelo governo do estado, o que gera uma defasagem anual de R$ 1,2 bi por ano, agravando a crise financeira e limitando melhorias. Na esfera federal, o gargalo apontado é o subfinanciamento do SUS, uma vez que são investidos na ordem de 4% do PIB, quando o mínimo deveria ser pelo menos 7%.

Outro ponto frisado no relatório aprovado foi a necessidade de maior fiscalização sobre a aplicação dos recursos federais destinados ao pagamento do piso, com responsabilização dos gestores que não estejam cumprindo a legislação e aprimoração dos mecanismos de monitoramento, com atuação ativa dos conselhos de saúde, do Ministério Público, dos sindicatos e dos Tribunais de Contas. Também em nível federal, outra medida necessária defendida durante os debates realizados nos últimos meses diz respeito ao Projeto de Lei 930/2024, em tramitação na Câmara dos Deputados, que regulamenta o dimensionamento das equipes de enfermagem como medida de valorização, segurança do cuidado e combate à sobrecarga de trabalho.

Cópias do relatório conclusivo com os dados, denúncias e recomendações serão encaminhadas ao Ministério da Saúde – que deverá sugerir a aplicação da iniciativa gaúcha a outros estados -, Ministério Público do Trabalho, Tribunal de Contas da União, Tribunal de Contas do Estado, Conselho Nacional do Ministério Público, Conselho Nacional de Justiça, Delegacia Regional do Trabalho e Casas Legislativas. “O trabalho da Comissão fortalecerá a luta dos profissionais da saúde por valorização e respeito”, destacou Valdeci.

Também participaram da reunião a deputada Stela Farias, Rodrigo Zucco, Cláudio Tasch, Miguel Rossetto, Halley Lino, Issur Koch e Airton Artus.