Na simbólica data do Dia Mundial em Memória das Vítimas de Acidentes de Trabalho, a Comissão de Saúde e Meio Ambiente da Assembleia promoveu, nesta quarta-feira (28/4), uma audiência pública para debater a precarização em curso, pelo governo federal, das Normas Regulamentadoras de Saúde e Segurança dos Trabalhadores, as chamadas NRs. Proposta pelo deputado Valdeci Oliveira (PT), a audiência teve como principal encaminhamento a realização de uma “radiografia” da situação dos Centros Regionais de Referência em Saúde do Trabalhador (CERESTs), os quais também foram tema do debate. Outro encaminhamento foi a elaboração de um documento para ser encaminhado ao governo federal e a Organização Internacional do Trabalho solicitando a suspensão da revisão das NRs durante a pandemia e também a revogação das revisões implementadas nos últimos meses.
Logo na abertura da atividade, Valdeci ressaltou a preocupação com a precarização dos CERESTs gaúchos a partir do fechamento das unidades de Passo Fundo e Canoas e da redução da abrangência do Centro de Porto Alegre, que passou de regional para municipal. “A cada minuto, ocorre um acidente de trabalho no Brasil, e, infelizmente, o Rio Grande do Sul está entre os estados que mais registram casos. Diante dessa realidade, ao invés de fortalecer as políticas e programas de saúde do trabalhador, o governo do Estado faz o contrário fechando CERESTs, reduzindo as equipes de técnicos de vigilância em saúde do trabalhador (que diminuiu de 12 profissionais para 6) e excluindo do Plano Estado de Saúde 2020-2023 a meta de se investigar os óbitos relacionados ao trabalho no Estado. Essa omissão e esse ataque à proteção dos trabalhadores são inaceitáveis”, disse Valdeci.
As lideranças presentes na audiência, que representaram diversas entidades e instituições, também criticaram fortemente as posições dos governos federal e estadual com relação à saúde e à segurança dos trabalhadores e defenderam que não ocorram alterações nas normas regulamentadoras durante a pandemia. “Há uma precarização de mais de 90% das normas regulamentadoras para favorecer o capital em detrimento da saúde e da vida dos trabalhadores. Infelizmente, está ocorrendo uma licença para matar. Estão deixando a ´raposa´ cuidar do ´galinheiro´. Hoje, um auditor tem que avisar a empresa antes de ir fiscalizar, o que é um absurdo”, afirmou o coordenador da Comissão de Saúde do Trabalhador do Conselho Estadual de Saúde e coordenador geral do Fórum Sindical de Saúde do Trabalhador (FSST), Alfredo Gonçalves.
O auditor fiscal do Ministério da Economia e representante do Instituto Trabalho Digno, Luiz Alfredo Scienza, criticou o peso dado aos empresários no processo de classificação dos riscos das atividades de trabalho. “Os empresários podem estabelecer como vão gerir os riscos das suas atividades. Mesmo em situações de risco óbvio ao empregado, o auditor fiscal ou outro agente do Estado perderá a capacidade de intervir”, alertou.
O presidente do Conselho Nacional de Saúde, Fernando Pigatto, relatou as ações da entidade na tentativa de barrar a precarização das NRs e bateu forte no que chama de “projeto de morte” do governo federal. “Está acontecendo um genocídio da população brasileira, e nós precisamos aumentar a nossa indignação e transformar o luto em luta. Não podemos permitir mais retrocessos e mais retirada de direitos. Esperamos que a CPI da Covid, recém instalada no Senado Federal, aponte responsabilidades sobre quem se omitiu no enfrentamento ao coronavírus”, assinalou.
A procuradora da República no Rio Grande do Sul Suzete Bragagnolo afirmou que já existe um inquérito civil aberto para apurar a aplicação de recursos nos CERESTs. “O plano de trabalho dos CERESTs tem que passar pelos conselhos de saúde, e isso não está ocorrendo”, afirmou ela, que sugeriu também o acompanhamento da questão pelo Tribunal de Contas do Estado.
O deputado estadual Pepe Vargas (PT) denunciou o desmantelamento das estruturas de fiscalização no país e afirmou que o Rio Grande do Sul não é referência nem em proteção aos trabalhadores nem no combate à covid-19. “O Rio Grande do Sul tem uma média de acidentes de trabalho superior à média nacional. E no país sequer temos mais as figuras dos ministérios do Trabalho e da Previdência”, acrescentou.
O representante do Sindicato dos Metalúrgicos de Marau, Passo Fundo e Tapejara, Alexson da Silva, lamentou o baixo número de Comissões Internas para Prevenção de Acidentes (CIPAs) nas empresas da região. “Temos mais de 1,4 mil empresas aqui, e não chegamos a 40 CIPAs”, ressaltou.
A presidente do Conselho Regional de Enfermagem (Coren-RS), Rosangela Schneider, centrou a sua fala na necessidade da sociedade concentrar esforços na luta contra o coronavírus. “Temos que centrar forças em proteger os trabalhadores e a sociedade. Não é hora de alterar qualquer norma (de segurança e saúde do trabalhador). Mais de 770 profissionais da enfermagem já foram a óbito no Brasil pela Covid-19, sendo 25 no RS.”, lamentou.
O representante do Ministério da Economia, Marcelo Naegele, procurou rebater as críticas e afirmou que há “transparência e ampla participação dos trabalhadores” na discussão das normas regulamentadoras. Mas o coordenador geral do Fórum Sindical de Saúde do Trabalhador (FSST), Alfredo Gonçalves, respondeu na sequência: “Nenhuma proposta feita pelos trabalhadores é aceita nessas discussões”.
O presidente do Conselho Regional de Fisioterapia e Terapia Ocupacional (Crefito 5), Jadir Lemos, também participou da audiência pública e cobrou que seja agilizada a tramitação do projeto de lei do deputado Valdeci que estabelece a obrigatoriedade da presença de fisioterapeutas 24 horas por dia nas UTIs do RS.