Por VALDECI OLIVEIRA (*)
Como tradição, as pessoas, ou pelo menos parte delas, costumam, a cada final de ano, fazer a sua lista de metas para o ano seguinte. É como um desafio que deve ser superado ou um momento a ser alcançado e que pode incluir, entre outros aspectos, trocar de emprego, perder peso, voltar a estudar, ficar mais com a família, parar de fumar, comprar um bem, realizar uma viagem. Geralmente são desejos que dependem mais da nossa própria vontade, empenho e dedicação.
Também existe a lista de desejos – essa não necessariamente maior – que almejamos não apenas para nós, mas para familiares, amigos, vizinhos, conhecidos. Nela geralmente incluímos fatores mais amplos, aqueles que dialogam com um espectro maior de pessoas.
Dias antes de 2019 chegar ao fim elaborei a minha, a de desejos. Em retrospectiva, olhei para trás, para um passado nada distante – pois foram somente 12 meses desde o último “ano novo” – para criar a lista que imaginava necessária, que desse conta de suprir meus anseios de um mundo e vida melhores. Confesso que não foi fácil, pois quanto mais avançava na busca dessa formulação mais cenas chegavam à minha memória. As imagens eram de acontecimentos e fatos acumulados durante o ano e indicavam que a tal lista de desejos seria grande, proporcional ao que avalio como perdas e retrocessos que, como sociedade, tivemos e vivenciamos no período.
Partindo do princípio – uma receita simples até – de que é com o passado que entendemos o nosso presente e com ele buscamos melhorar o nosso futuro, tive a certeza de que em 2020 teremos, caso o desejo de evoluirmos como seres humanos e como sociedade seja amplo e verdadeiro, de exercitar em muito nossos sentimentos e ações de solidariedade com o próximo, de tolerância com os diferentes, do viver o coletivo em detrimento do individual, de buscar na cultura da paz os argumentos necessários para o convencimento daqueles que minimizam o fato de que dor e violência geram mais sofrimentos.
Na verdade, são desejos que me acompanham há muito tempo, mas que os renovo a cada início de ano, pois tenho a plena convicção de que, conforme avanço no tempo e aprendo com a vida, esses desejos – utópicos ou não – são necessários, fundamentais para garantir a nossa existência e convivência civilizada.
São desejos para que não nos acostumemos e nem aceitemos como normal o fato de caminharmos por calçadas cujos cantos se transformaram em camas ou moradias de outros seres humanos. São desejos que acreditam no poder do diálogo, que veem a política como a arte do convencimento e convivência. São desejos que buscam e creem na convergência do interesse coletivo, numa sociedade que ofereça condições e oportunidades a todos, independentemente de sua condição social, religiosa, de gênero ou da cor da pele.
Desejo que, em 2020, os ganhos econômicos sejam melhor distribuídos, que as universidades públicas ofereçam mais vagas e tenham seus orçamentos garantidos, que a diversidade cultural brasileira seja respeitada e reverenciada por aqueles que exercem o poder político e que o acesso à saúde seja uma porta ampla e aberta.
Desejo que a Justiça seja realmente independente dos interesses particulares, que sua aplicação não leve em conta as cores partidárias ou sociais. Que os privilégios não sejam vistos como meros direitos conquistados, que a democracia se fortaleça e permeie todas as relações, sejam públicas ou privadas.
Desejo que tenhamos mais alimentos e menos venenos em nossas mesas, que a água que bebemos e o ar que respiramos não prejudiquem a nossa saúde e que tenhamos todos e todas condições e acesso a eles. Que nos importemos com a fragilidade do nosso meio ambiente e com a defesa da natureza.
Que a cidadania e a dignidade humana caminhem de mãos dadas, sejam defendidas, aprimoradas. E a justiça social tenha sua aplicação além de conceito abstrato, além da letra fria da lei e que experimente, nesse novo ano, o avanço necessário para que dela todos desfrutem ganhos.
Que as famílias, não importando a sua configuração, mas sim o amor e o respeito que nelas habitam, fortaleçam seus laços de união e cumplicidade. E que diante da dor e da perda sejamos reconfortados, assim como reconfortemos aqueles que necessitem do nosso apoio.
E que esses desejos não fiquem relegados a meros destaques nos discursos dos governos, do embate entre esquerda e direita, entre capital e trabalho, entre “gente de bem” e marginalizados, mas que façam parte do nosso cotidiano, que sejam tão normais e comuns como o ato de respirarmos.
São desejos reais os que tenho, que almejo. Mas sei que sua concretização dependerá não somente de mim, pois essa possibilidade repousa sobre nós enquanto comunidade, sociedade, estado e país como resultado de nossas escolhas e ações. E justamente por isso farei o que estiver ao meu alcance – e o convido a fazer o mesmo – para convencer mais e mais pessoas de que um outro mundo é possível, mais humano, justo e belo.
Como disse o Papa Francisco, “felizes são aqueles que semeiam paz com as suas ações diárias, com atitudes e gestos de serviço, fraternidade, diálogo, misericórdia (…). Fazer a paz é um trabalho que se deve realizar todos os dias, passo a passo, sem nunca nos cansarmos”. Para Bergoglio, “a família é o hospital mais próximo, a primeira escola das crianças, o grupo de referência imprescindível para os jovens, o melhor asilo para os idosos”.
Um feliz 2020 a tod@s!!