Meio ambiente ou negacionismo? Só um caminho vale a pena – por Valdeci Oliveira

Nunca imaginei que, diante do avanço tecnológico e científico, chegaria um momento da vida tendo que defender o óbvio. Sempre tive noção que o embate, este permanente, em defesa dos direitos e melhores condições de vida e de trabalho às pessoas seriam uma constante, pois se tratam de visão de mundo e não depende da ciência ou da sua evolução. Mas ter de convencer as pessoas de que a nossa vida está intimamente relacionada a forma com tratamos ou exploramos a natureza chega a ser inacreditável, principalmente diante de tudo o que temos visto nos últimos anos.

Dito isso, tenho a plena convicção de que hoje, infelizmente, o maior inimigo do ser humano é o próprio ser humano, que munido de vasta ignorância (da qual muitos têm orgulho de ostentar) tem como aliado incondicional o negacionismo ambiental, o verdadeiro algoz da sua própria existência.

Alimentado por opiniões apoiadas em teorias conspiratórias, que mantêm viva a chama desse obscurantismo medieval, o negacionismo ora em voga afirma ter provas de que tudo não passa de situações cíclicas, naturais, provocadas por um tipo de antena ou que fazem parte da evolução do planeta. E nesse caldeirão que ferve, inclusive, almas inocentes, há lugar para tudo, incluindo a pulverização proposital das nuvens, esta relacionada às intensas chuvas que caíram em nosso estado a partir do final de abril.

Não de hoje, essa postura, de forma cada vez mais forte, cria vítimas e cobra faturas. E justamente por isso que há anos me aliei à luta daqueles e daquelas que acreditam que a sustentabilidade do nosso planeta não é barreira para o desenvolvimento econômico e social. Mais de duas décadas atrás, quando assumi a prefeitura de Santa Maria, criamos pela primeira vez na história da cidade a secretaria municipal de meio ambiente, pois defendia que o tema precisava de uma pasta exclusiva, com orçamento próprio e ações constantes. E um dos orgulhos que carrego daquele período foi ter acabado com o lixão da Caturrita, que por mais de 20 anos vinha recebendo todo descarte doméstico urbano, depositado sob um solo sem qualquer preparo ou proteção, e ter investido pesado na construção de um aterro sanitário, qualificado e elaborado sob as mais rígidas determinações de controle existente à época e que se encontra em plena atividade até hoje.

Também foi esta consciência – que prefiro chamar de obrigação de gestor público – que me levou a aproveitar a oportunidade concedida pelo segundo governo do presidente Lula, através de um projeto no âmbito do PAC, que resultou na elaboração de um plano, apontando áreas de alagamentos ou possibilidade de deslizamentos. E foi tal estudo que balizou a liberação, no mês passado, de R$ 33 milhões pelo governo federal para obras de contenção de morros que deverão ser feitas na rua Canário.

A nobre experiência que tive frente a um cargo executivo me mostrou que as demandas são muitas e as deficiências maiores ainda. Mas ao mesmo tempo, toda ação por nós tomada é fruto de escolhas políticas. E a proteção do meio ambiente, infelizmente, muitas vezes passa ao largo das administrações públicas. Vimos isso na nenhuma importância que os governos de Eduardo Leite e José Ivo Sartori deram ao tema nos últimos anos, posturas que, somadas aos eventos que vem assolando o RS, levaram a bancada do Partido dos Trabalhadores na Assembleia Legislativa a cerrar fileiras em defesa da criação de uma Comissão Permanente que trate do tema e das mudanças climáticas (hoje, saúde e meio ambiente fazem parte de um mesmo colegiado).

De forma propositiva, entendemos que o assunto é extremamente importante e precisa deixar de ser algo acessório, que passa ao largo dos debates centrais, lembrado apenas durante as eleições, e venha a se tornar o principal, ainda mais se considerarmos que no último período houve um conjunto de mudanças nocivas na legislação e uma desestruturação de vários instrumentos da gestão pública. É preciso que tenhamos vivo na memória que a Fundação Zoobotânica foi extinta, está se tentando concessionar o Jardim Botânico e o Zoológico (que poderia preservar a nossa fauna silvestre); que a Fundação Estadual de Proteção Ambiental, que deveria ter 771 servidores e 534 analistas, conta apenas com 322 e 178, respectivamente; que os códigos Florestal e Estadual de Meio Ambiente foram duramente alterados e flexibilizados e alteração da lei dos agrotóxicos, até então tida como modelo, foi totalmente desfigurada. E que tudo isso somado, gera prejuízos bilionários e impactos sociais brutais.

Tenho defendido também, de forma enfática, que a educação ambiental nas escolas venha a se tornar uma matéria permanente, caso contrário vamos continuar enxugando gelo.

E como disse o professor Paulo Brack, biólogo, mestre em botânica pela UFRGS e doutor em Ecologia e Recursos Naturais, diante das posturas nocivas ao meio ambiente que se consolidaram nos últimos anos, cabe à sociedade não votar em negacionistas e acreditar sempre na ciência.

Foto: RICARDO STUCKERT/Presidência da República