Por Valdeci Oliveira –
Nos últimos 365 dias, tivemos o orgulho, a satisfação e a imensa responsabilidade de presidir a Assembleia Legislativa, uma das mais importantes e plurais instituições do Rio Grande do Sul. Nesse período repleto de atividades, procuramos, de forma coletiva e colaborativa, colocar como foco central da atuação do Parlamento gaúcho, sem esquecer de vários outros temas, o enfrentamento àquela ferida social que considero a mais grave do estado e do país no momento: a fome.
Logo que tomamos posse na chefia do Legislativo estadual, no dia 31 de janeiro do ano passado, anunciamos, em nosso primeiro pronunciamento, que a escalada da insegurança alimentar – dentro de um Rio Grande e de um Brasil que são referências internacionais na nobre tarefa de produzir alimentos – era vexatória e exigia providências imediatas, consistentes e, se possível, encorpadas por um mutirão de forças. Depois de diversas rodadas de diálogos e estudos, conseguimos colocar em pé uma força-tarefa estadual voltada ao fortalecimento urgente do combate à falta de comida no prato. A constituição do Movimento Rio Grande Contra a Fome, fruto da parceria inicial entre a Assembleia Legislativa, o Governo do Estado, o Tribunal de Justiça, a Defensoria Pública, o Tribunal de Contas do Estado e o Ministério Público e, na sequência, com a adesão de muitas outras entidades, representou uma união inédita de esforços da coletividade gaúcha contra algo que jamais pode ser aceitável.
O saldo principal desse enlace interinstitucional certamente foi a sensibilização da sociedade para um tema que estava um tanto quanto apartado dos debates públicos. O “Rio Grande Contra a Fome”, junto com outras iniciativas, estudos e ações, ajudou a colocar o enfrentamento à insegurança alimentar no radar de boa parte dos gestores e autoridades do nosso Rio Grande. Além disso, o Movimento, a partir das mais de 50 iniciativas de arrecadação de alimentos, viabilizou mais de 230 toneladas de comida, as quais foram entregues à Central de Doações da Defesa Civil Estadual para posterior repasse às pessoas em situação de vulnerabilidade social. Outra colaboração extremamente relevante da força-tarefa foi a destinação, no final de 2022, de R$ 40 milhões – sendo R$ 20 milhões do caixa da Assembleia Legislativa e outros R$ 20 milhões do Tribunal de Justiça – para o Fundo Estadual de Assistência Social. Essa medida, firmada a partir da assinatura de termos de cooperação, garantirá a aquisição de 140 mil cestas básicas, o que vai beneficiar mais de 600 mil pessoas.
Tudo isso certamente foi muito importante, mas o trabalho já realizado, sabemos, ainda é insuficiente perto do desafio posto: conforme o 2º Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia da Covid-19 no Brasil (trabalho da Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional – Rede PENSSAN), 33 milhões de cidadãos e cidadãs do nosso país (cerca de 15% da população), pasmem, passam fome nos dias atuais. Por causa disso, nós já definimos que o combate ao déficit alimentar e nutricional será uma das diretrizes do nosso novo mandato na Assembleia Legislativa, atribuição que nos foi conferida, nas Eleições de 2022, pelo voto soberano de mais de 70 mil gaúchos e gaúchas. Para demonstrar na prática o nosso comprometimento com a causa, logo na abertura do ano legislativo, na última quarta-feira (1º de fevereiro), nós protocolamos, na Assembleia Legislativa, o projeto de lei que prevê a criação da política estadual de combate à fome no Rio Grande do Sul. Ao mesmo tempo, também protocolamos o pedido para abertura de uma frente parlamentar acerca da mesma temática.
No nosso entendimento, o embate à insegurança alimentar não pode ficar flutuando nas esferas administrativas ou permanecer apenas no terreno estéril das boas intenções. A ação tem que estar posta e sublinhada nos orçamentos públicos e nas legislações públicas, pois só assim nós vamos ampliar e institucionalizar a adoção de políticas públicas concretas, contínuas e resolutivas, as quais vão fazer a diferença na vida das pessoas fragilizadas.
Recentemente, nós encerramos a nossa gestão na presidência do Parlamento gaúcho, mas o compromisso em ajudar na mobilização para tirar o Rio Grande e o Brasil dos mapas da fome seguirá sendo um compromisso inabalável nosso. Bato sempre na tecla: onde existe fome, a educação, a saúde, a cultura e a inclusão não entram ou demoram muito mais tempo para se fazerem presentes. Nunca nos esqueçamos disso!
Foto: Divulgação MTD – Movimento de Trabalhadoras e Trabalhadores por Direitos