Por Valdeci Oliveira –
Há 40 anos em discussão no Brasil e nunca levada adiante, a reforma tributária finalmente foi aprovada na Câmara dos Deputados. Por ser um verdadeiro “gol de placa” há muito desejado, atraiu a ira dos oposicionistas e dos prepostos do andar de cima privilegiado. Claramente pensada para organizar nosso sistema de impostos e imprimir o que podemos chamar de “justiça fiscal”, ela será implementada aos poucos, sendo finalizada somente na próxima década. Mesmo sendo fruto de muita discussão, tem um segmento que nos últimos dias apontou sua artilharia para a figura do ministro Fernando Haddad, tentando fazer crer junto à população que a reforma aumenta a carga tributária nacional ao mesmo tempo em que está longe de ser benéfica para a maioria da sociedade. E para isso escondem que a reforma reduz a carga tributária para 90% do povo brasileiro, que o imposto da cesta básica foi zerado, que os mais pobres terão reduzidas suas contas de água, luz, gás e receberão de volta parte dos impostos cobrados no consumo, medida irá beneficiar perto de 30 milhões de famílias, algo como 73 milhões de pessoas.
Como tem sido divulgado nos últimos meses, o modelo a ser implantado no Brasil é o mesmo utilizado em mais de 170 países, unifica impostos, abrange todas as mercadorias e serviços, elimina a cobrança em cascata, traz segurança jurídica, não incide sobre investimentos e exportações, garante a devolução rápida dos créditos acumulados e contribuição fica no local onde a mercadoria ou serviço foi consumido. Na prática, simplifica a tributação, traz mais transparência, desburocratiza e reduz desigualdades sociais e regionais.
Se, por um lado, os detratores não medem o peso nas críticas, eles também, no que consideram ‘positivo’, vendem a falsa narrativa de que foi por mérito e articulação próprias. A inclusão da carne na cesta básica é o exemplo mais patente. E, de novo, escondem, por exemplo, que atuaram ferozmente para que armas e munições ficassem de fora do Imposto Seletivo Federal, que incidirá sobre bebidas alcoólicas, cigarros e agrotóxicos.
A verdade não importa, como nunca importou para essa turma. Se alguém acredita que a reforma é prejudicial, basta lembrar que os que a criticam não deram um “piu” sequer quando foi aprovada, por Michel Temer, a Reforma da Previdência, que tiranicamente acabou com a possibilidade de se ter direito a uma aposentadoria digna na velhice. Também não emitiram um som sequer quando Bolsonaro, via Reforma Trabalhista, ceifou a CLT e criou aberrações como o trabalho intermitente, em que a pessoa é chamada para trabalhar esporadicamente e recebe de forma proporcional, o que, invariavelmente rende menos que um salário mínimo mensal.
Também não lembro de uma frase sequer contra a isenção de impostos, também no governo passado, para jet skis, lanchas, balões e dirigíveis. De todo esse ‘abrir mão’ de impostos, nenhum beneficiou realmente a população em geral, muito menos as pessoas de menor renda. Mas, mesmo assim, nenhuma dessas vozes veio a público emitir sua ‘preocupação’ ou contrariedade.
Esses mesmos paladinos da retórica escondem que a reforma tributária também visa arrumar as contas públicas, visto que o verdadeiro interesse é sobrar mais recursos para eles próprios se beneficiem do estado brasileiro, situação muito bem abordada pelo jurista, sociólogo, historiador, cientista político e escritor Raymundo Faoro em sua célebre obra “Os donos do Poder – Formação do Patronato Político Brasileiro”.
Esses mesmos críticos da reforma tributária viram a cara para o outro lado quando lhes é mostrado que deixamos de arrecadar R$ 546 bilhões por conta de benefícios fiscais ou que saíram dos cofres do Tesouro R$ 790 bi para pagamento de juros da dívida pública – aos especuladores – somente em 2023.
A verdade é que ao se buscar corrigir distorções fiscais e mostrar que elas se configuram em verdadeiros escárnios num país desigual como é o Brasil, sempre haverá quem defenda, de forma escamoteada, os privilégios dos setores privilegiados do nosso país.
Se vamos falar em a carga tributária, falemos que ela alcançou o patamar de 33,07% do PIB em 2022, maior índice registrado no país nos últimos 12 anos. E que, em um ano de Lula, com Fernando Haddad na Fazenda, essa carga foi reduzida para 32,44%.
Pode-se até dizer que ainda não é a ideal, no que concordo, mas a possível (e é um avanço) considerando a heterogeneidade vista no Congresso Nacional, que, ao fim e ao cabo, é um espelho da própria sociedade brasileira, gostemos ou não.
Dizer que a reforma aumenta a carga tributária nacional e que prejudica o trabalhador é apenas mais uma inverdade de quem sempre lucrou com a pobreza e a exploração alheias.
Foto: Ricardo Stuckert / PR