Por VALDECI OLIVEIRA –
Dentre as várias ações que a complexidade da pandemia do novo coronavírus está impondo a todos os países, com o objetivo de frear o ciclo de contaminação e assim tratar e salvar o maior número possível de vidas, tem uma que me parece urgente. Ao lado das já aplicadas e corretas medidas de confinamento social e restrição à movimentação das pessoas, é imprescindível que as autoridades do país, em seus diferentes níveis públicos, adotem uma renda básica àquela parcela da população desassistida, incluindo aí os trabalhadores e trabalhadoras informais e os desempregados e desempregadas.
Não estamos falando de centenas e nem de milhares de homens e mulheres. Estamos falando de milhões de pessoas pobres ou, mesmo empregadas, que, como dizemos popularmente, vendem o almoço para comprar o jantar. São famílias que não têm outra opção a não ser sair às ruas em buscas de “bicos”, vender quinquilharias nas sinaleiras ou revirar nossos lixos em busca de algum alimento, das sobras que ficaram em nossos pratos.
Na verdade, a renda básica se trata de uma medida que já se fazia necessária antes mesmo da pandemia, naquele Brasil que emergiu das reformas aprovadas pelo governo federal, normalizou o trabalho informal e tornou “aceitável” a precarização do trabalho e a retirada de direitos fundamentais da nossa população. Um Brasil que, entre outras coisas, naturalizou a atuação sem carteira assinada e sem direitos trabalhistas garantidos e que banaliza a existência de milhões de “sem- empregos”.
Por conta dos efeitos da crise do coronavírus sobre as atividades econômicas, em questão de semanas, essa leva gigantesca de jovens, adultos e idosos não terão sequer o mínimo para si e suas famílias se não existirem ágeis e desburocratizados dispositivos de proteção financeira.
Na busca de alternativas viáveis para enfrentar cenário tão adverso, a implementação imediata, no RS, de um programa emergencial de renda básica, se constitui em uma medida adequada e de rápido resultado. Por compreendermos isso e sermos defensores de uma política permanente de renda básica no estado e no país, nós já solicitamos uma agenda com o governador Eduardo Leite para apresentar em detalhes uma proposta de execução da medida. Ressaltamos que, ainda em novembro do ano passado, muito antes de soar o alarme do Covid-19, o nosso mandato protocolou, no parlamento estadual, um projeto de lei que visa instituir uma política estadual de renda básica no RS, ou seja, uma política permanente e efetiva de apoio a quem mais precisa em nosso território.
Estamos propondo que o governo gaúcho inicie o fornecimento desta Renda Básica Emergencial pelas crianças e idosos, até que possa atender todas as pessoas em situação de extrema pobreza. E existem mecanismos para isso, entre eles o Fundo de Proteção e Amparo Social (Ampara RS), que pode servir como fonte de financiamento dessa política. Temos a plena segurança que, dessa forma, se torne viável, pelos próximos 180 dias, inicialmente, garantir uma renda extra de R$ 100 mensais para cada criança e idoso incluído na faixa do programa. A adoção da renda básica no Estado, sublinhamos, não configuraria, de forma alguma, um casuísmo. Essa política está prevista na legislação nacional desde 2004, por força da aprovação da proposta do ex-senador Eduardo Suplicy no Congresso Nacional. E recentemente também, após a eclosão da pandemia do coronavírus, os 27 governadores do país assinaram um manifesto endereçado ao presidente da República onde defendem publicamente, entre outros pontos, a renda básica como forma de minimizar os problemas sociais neste momento. Inclusive, é possível que a Câmara Federal, por iniciativa das bancadas de oposição, vote e aprove uma proposta de Renda Básica em nível federal, o que seria extremamente oportuno.
Diante das ações erráticas e do descrédito do presidente da República para lidar com tão grave crise social e de saúde, o governador Eduardo Leite precisa ocupar a linha de frente do processo de redução de danos sociais advindos da pandemia. Unir esforços e buscar imprimir rapidez nas decisões farão toda a diferença de preservar ou não a vida de muitos gaúchos e gaúchas que habitam os cinturões de pobreza do nosso estado.
Não existe algo mais indigno do que a fome e nada mais criminoso do que não tomar medidas concretas para superá-la. Como dizia o saudoso Herbert de Souza, o Betinho, que morreu lutando por um modelo de sociedade mais justo e igualitário, “quem tem fome, tem pressa”.
(Imagem: Agência Brasil)