Por Valdeci Oliveira –
Como seres sociais, aos poucos e dentro do possível, vamos nos reorganizando enquanto sociedade e suas relações interpessoais após mais de um ano e meio do início da pandemia, quando a tônica foi o distanciamento social e outras regras para se cumprir os protocolos sanitários que garantiram um mínimo de segurança às pessoas. E que por certo foram – e continuam sendo – necessários, apesar dos sinais invertidos emitidos por alguns e seguidos por outros muitos. Mas chegamos até aqui e muito aprendemos, forçosamente, sem dúvida, e não sem dor e luto.
E nesse sentido, de aprendizado e de respeito à ciência, entre este domingo, 3 de outubro, e o próximo dia 10 de outubro, Santa Maria irá presenciar um pouco dessa reorganização, dessa retomada, mesmo que tímida, em busca por transitar entre o que se batizou de “novo normal”. E o será justamente com um grande evento da cidade, uma das suas marcas, a 27ª edição da Feira Internacional do Cooperativismo (Feicoop), onde a Economia Solidária mostra, com rostos, gestos, desejos e ações toda sua legitimidade e potencial formatados a partir das várias facetas da construção coletiva e da organização popular.
Com a consciência de que ainda não saímos do redemoinho ao qual fomos sugados pelo misterioso e invisível algoz, a organização do evento, capitaneada pelo Projeto Esperança/Cooesperança da Arquidiocese de Santa Maria – mas incluindo a nossa UFSM, poder público municipal e entidades como a Cáritas, Instituto Federal Farroupilha (IFFar), entre outras organizações sociais e populares – a Feicoop de 2021, assim como todos nós, precisou se adaptar. Já tinha sido assim em 2020, quando a mutação imposta refletiu na substituição do contato humano pelo virtual, o que permitiu o debate e a troca de experiências.
Sem reclamar ou culpar alguém e sob o lema “Construindo a Sociedade do Bem Viver: Por uma Ética Planetária”, que por si só já nos chama à reflexão, a edição 2021 da Feicoop, que é a mais importante feira da economia solidária da América Latina, ocorrerá tanto on-line, com atividades sendo transmitidas ao vivo via redes sociais, como presencialmente. Para isso, estabeleceu critérios sérios em conformidade aos protocolos sanitários contra a disseminação da covid-19, reduziu o público presente e contará apenas com empreendimentos do RS. Foi essa a forma encontrada, em meio às incertezas e dor impostas a toda a sociedade, para continuar sua missão, iniciada quase três décadas atrás, que é a de mostrar que um outro mundo é possível, que a economia pode e deve ser inclusiva, que há espaço para todos e todas, seja na produção quanto no consumo, principalmente quando ambos trazem junto o substantivo “consciente”.
A Feicoop veio para mostrar que a agricultura familiar, assim como outras formas autogestionárias, é sustentável. Ela veio para dar eco às vozes de lutadoras e lutadores sociais que a cada dia, paciente e ininterruptamente, colocam um tijolo a mais na parede da igualdade e da justiça social. E são muitas essas vozes. Elas são de mulheres e homens brancos, quilombolas, indígenas, católicos, evangélicos, de religião afro e até mesmo sem religião alguma.
Nesses seus quase 30 anos, a Feira Internacional do Cooperativismo tem demonstrado que existem outras opções de desenvolvimento e este pode ser socialmente sustentável, solidário e participativo. Um desenvolvimento que não precisa deixar ninguém à margem, que enxerga e respeita a diversidade, que não discrimina alguém a depender do seu gênero ou etnia, que encara a política como uma ferramenta de busca e construção de consensos e que leva em conta que a voz do povo precisa ser, além do ouvida, compreendida. Um desenvolvimento que entenda que a nossa casa não é somente da porta para dentro, mas tudo mais que nos rodeia.
Serão esses conceitos, essas visões de mundo que estarão disponíveis a quem for no Centro de Referência de Economia Solidária Dom Ivo Lorscheiter. Serão essas as palavras que, em suma, serão pronunciadas pela amiga Irmã Lourdes Dill, que coordena o Projeto Esperança/Cooesperança, que fez aniversário na última quarta-feira e que nos orgulha sobremaneira pelo engajamento em torno daqueles que mais precisam.
Por último, saliento: participar da Feicoop é participar de uma jornada coletiva por inclusão, justiça e igualdade. É acreditar que a esperança, a luta justa e a solidariedade são os grandes referenciais para um mundo verdadeiramente humano. Eu – como faço desde os idos dos anos 90, quando o evento surgiu em meio ao barro e a uma estrutura bastante limitada – estarei presente na Feira para ajudar a construir coletivamente uma nova sociedade, a sociedade do “Bem Viver”. E você – de Santa Maria e de todo Rio Grande – está convidado a participar junto, seja pelas redes sociais da Feicoop e do Projeto Esperança/Cooesperança, seja presencialmente, com a máscara no rosto. Como a Irmã Lourdes lembra sempre, “nem a chuva, nem o vento interrompem o nosso movimento.”
Artigo originalmente publicado no site www.claudemirpereira.com.br