Por Valdeci Oliveira –
O rico no Imposto de Renda (IR) e o pobre no orçamento. Esse foi o projeto defendido por Lula nas eleições de 2022 e escolhido pela maioria do povo brasileiro, mesmo que alguns não aceitem, inclusive com tentativa de golpe de estado e garrote das finanças públicas via Congresso Nacional. E por mais óbvio, lógico e necessário que isso possa parecer, a justiça social não é a realidade da imensa maioria da população brasileira. Como bem descreve o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, nas inúmeras entrevistas que tem concedido, o Brasil aplica a fórmula ao contrário: o pobre paga o Leão e os mais bem aquinhoados passam ao largo, além de serem beneficiados com os recursos do orçamento, principalmente porque 44% de tudo o que se arrecada vai para o pagamento dos juros e amortização da dívida pública. E não precisa ser muito esperto para saber quem detém a quase totalidade desses títulos e embolsa praticamente todo esse dinheiro, que neste ano deverá chegar a R$ 1 trilhão por conta das taxas de juros.
Um país às avessas, como pontuou Haddad, pois, a todo momento, setores muito bem representados no Congresso Nacional neutralizam qualquer tentativa de mudança estrutural que vise alterar esse cenário injusto para a maioria dos mais de 210 milhões de CPFs. Derrubar, nesta semana, a Medida Provisória (MP) do governo que amplia o IOF foi uma delas, protegendo o “andar de cima”, mantendo privilégios fiscais do setor financeiro (o mais lucrativo, principalmente em tempos de crise), dos especuladores, das fintechs (que não eram reguladas até pouco tempo atrás) e das bets, que há pouco deram muito pano para manga, inclusive com uma CPI.
Blindar a carga tributária das ´coberturas’, feito pelo ‘sindicato dos ricos’, como têm sido chamados esses parlamentares, é vergonhoso, pois o fazem exigindo do governo mais cortes no orçamento, que nada mais é que ampliar a tesoura em recursos do SUS, da previdência, da educação, das estradas, do saneamento básico. Não por coincidência, tudo isso é voltado aos meros mortais, cujos interesses, em tese, são representados por 594 parlamentares num Congresso formado por 273 empresários e 160 fazendeiros que, em bloco, detém 72% dos votos.
Para derrubar a MP do IOF, num ato inconstitucional (se trata de matéria exclusiva do Poder Executivo), deputados federais argumentam que a União gasta demais, apesar de tudo que tem sido feito pelo governo do presidente Lula é orientado pelo cumprimento das regras do arcabouço fiscal e seus limites rígidos para as despesas, bem diferente da época da Lei do Teto de Gastos, completamente ignorada em todo o governo passado.
A tal ‘gastança’ não resiste a uma simples análise macroeconômica, com menor taxa de desemprego das últimas décadas, inflação sob controle, superávit primário e redução do déficit de 2,3% para 0,09% do primeiro para o segundo ano do governo.
Ao protegerem os ricos, congressistas de norte a sul apostam na piora das contas públicas visando as próximas eleições. Tão ‘receosos’ quanto a gastos, em ato contínuo aprovaram o aumento no número de parlamentares, uma despesa de R$ 600 milhões durante os quatro anos de uma legislatura. Como efeito cascata, algumas Assembleias Estaduais também deverão abrir novas vagas, a um custo de R$ 85 milhões por ano. A liberação de parlamentares acumularem aposentadoria e salário, extrapolando em muito o teto do serviço público, é outro mimo que estão se presenteando. Mas o problema do país é ter um governo que busca cobrar imposto de milionário.
Enquanto isso, a proposta do presidente Lula em isentar salários até R$ 5 mil e redução da carga para rendas até R$ 7 mil, o que beneficiaria mais de 10 milhões de pessoas, sequer saiu da comissão em que está sendo analisada. Mas o presidente da Câmara, o mesmo que puxou o tapete na questão do IOF, já sinalizou que seus pares são contra compensar a isenção dos assalariados cobrando um mínimo dos pouco mais de 140 mil abastados ‘esquecidos’ pelo Fisco e que ganham mais de R$ 50 mil por mês – ou seja, 0,13% de todos os contribuintes do país.
O fato é que estão protegendo as altas rendas em detrimento de uma justiça tributária para a maioria. E sequer se trata de cobrar imposto do rico, mas sim do rico que não paga ou recolhe muito pouco se comparado a uma professora, um policial, uma enfermeira, um jornalista ou um motorista de ônibus. O que o ministro Haddad tem indagado publicamente, é como alguém, que mora num dos dez países mais desiguais do mundo, aceita que quem tem uma renda anual de mais de R$ 1 milhão pague, em média, uma alíquota de 2,5%. Os profissionais que citei acima pagam em média 10%.
Diante de tudo isso, uma pergunta cuja resposta é tão ou mais incômoda: com quantos pobres se faz um rico?
Para eles, com a hipocrisia que lhes é comum, embalada por um sorriso cínico, o problema do Brasil é o governo Lula atender aos interesses da maioria do povo.