Por Valdeci Oliveira –
Na última segunda-feira (22), o mundo comemorou o Dia da Água, data escolhida pela Organização das Nações Unidas (ONU) para que os estados nacionais chamem atenção à importância desse bem tão fundamental para a manutenção da vida. Recurso frágil e limitado, cerca de 98% de toda a água que cobre nosso planeta é salgada. A maior parte do restante, que é próprio para o uso humano, está dividida entre as calotas do globo e as geleiras. E uma diminuta porção fica em lagos, rios ou escondida nos subterrâneos da Terra. Por isso, a importância de tratarmos a água com o devido respeito e cuidado. Ter acesso a ela é um direito inalienável, é uma questão de saúde pública. Em regiões do planeta onde ela não é abundante, guerras já foram travadas pelo seu controle.
Vale ressaltar que menos de dez países concentram 60% dos recursos de água doce disponíveis no planeta, e o Brasil está entre eles. E quando falamos em reservatórios subterrâneos, o Rio Grande está sobre aquele que é considerado o maior do mundo, o Aquífero Guarani. Poderíamos dizer, então, que estamos distantes de qualquer tipo de escassez. Não é bem assim. Os rios dos Sinos, Gravataí e Caí, por exemplo, estão entre os mais poluídos do Brasil. Mais de um milhão de gaúchos e gaúchas não têm acesso à água tratada, índice que no Brasil encosta nos 35 milhões de pessoas.
Encarar a água como um bem inegociável é uma pauta urgente. O assunto voltou a chamar mais a atenção a partir das discussões acerca das mudanças climáticas ocasionadas pelo aquecimento global. Trata-se de um tema que envolve muitos interesses, principalmente financeiros, estes inversamente proporcionais às carências de milhões de seres humanos. Estamos diante de um debate que discute se a água deve ser ou não uma commodity privada, como o são a soja, café, minérios ou petróleo. Estamos discutindo se a água deve ser negociada na bolsa de valores e tornar-se um atrativo financeiro para investidores cujo único compromisso é a exigência em receber seus dividendos.
Por isso, tenho plena convicção de que, neste momento, em que todos os setores da sociedade estão concentrando suas forças no combate à pandemia, é inoportuno ao governador Leite propor a privatização da nossa Companhia Riograndense de Saneamento (Corsan), principalmente por ter afirmado o contrário quando disputou as eleições para governador. Assim como é inoportuno o governador se aproveitar de um veto de Bolsonaro ao Marco Regulatório do Saneamento Básico para “reciclar” o discurso. Com 300 mil mortos pela covid registrados, e sem perspectivas de melhora a curto prazo, não há possibilidade alguma de os trabalhadores e a sociedade civil contrários à proposta se mobilizarem em defesa do que acreditam. E com o intuito do Executivo de extinguir a lei que exige plebiscito prévio às privatizações da Corsan e do Banrisul também nos será sonegado um debate sério e transparente a respeito. E esse tema diz respeito à vida de milhões de gaúchos e gaúchas e ao destino de uma importante empresa pública, cujo caráter social possibilita a ela determinar o preço do seu serviço em um patamar justo e oferecer vantagens em momentos trágicos como o atual.
Sempre que a Corsan foi valorizada – como no governo Tarso Genro, ocasião em que a companhia captou R$ 4,4 bilhões via o PAC (governo federal de Dilma Rousseff) para realização de investimentos – o saneamento e o abastecimento de água avançaram no Rio Grande do Sul. E essa política refletiu em Santa Maria, onde, hoje, está em andamento a duplicação da Estação de Tratamento de Esgoto, o que irá garantir saneamento tratado para 85% da população já em 2025, ou seja, bem antes do prazo determinado na nova legislação, que é 2033. Importante registrar: o recurso do PAC foi decisivo para a assinatura do novo contrato da Corsan com o município em 2018. E esse contrato já colocou R$ 85 milhões nos cofres da Prefeitura. A partir do ano que vem, através do Fundo de Gestão Compartilhada, 6% do faturamento mensal local da Companhia vai para o caixa do Executivo Municipal. Serão 10 milhões por ano destinados diretamente para aplicação na cidade, para gerar melhorias nos bairros, vilas e distritos. Após a conclusão das obras de ampliação da Estação de Tratamento de Esgoto, a arrecadação global da Corsan em Santa Maria vai passar dos atuais R$ 15 milhões/mês para R$ 20 milhões/mês. Porém, se ocorrer a privatização, quem irá lucrar serão aqueles que não colocaram um tostão sequer nesse projeto, que contou exclusivamente com recursos públicos para sua viabilização.
Por tudo isso, junto com os trabalhadores da Corsan, com o Sindiágua e com todos e todas que entendem que água e saneamento não são fonte de lucro, mas, sim, de saúde e vida, nós vamos cerrar fileiras, até o final, contra a tentativa de privatização da Corsan no RS. A nossa bancada na Assembleia Legislativa está ao lado da água pública até debaixo d´água.
(Artigo originalmente publicado em www.claudemirpereira.com.br)