Na antevéspera do encerramento do mês de março – momento que oportuna e legitimamente a sociedade homenageia e valoriza o papel das mulheres -, eu não poderia deixar de me manifestar sobre a vergonhosa escalada da violência registrada contra o sexo feminino no Brasil. Como faço parte daquele grupo de pessoas que tem ojeriza completa à covardia, seja ela qual for, é pouco suportável conviver placidamente com essa proliferação de atos de agressão, de feminicídios e de assédios registrados de norte a sul do país.
Os números são contundentes: uma pesquisa encomendada pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP) ao Instituto Datafolha indica que, somente no acumulado de 2018, 1,6 milhão de mulheres foi espancada ou sofreu tentativas de estrangulamento. O mesmo levantamento aponta que, nos 12 meses do ano passado, 22 milhões de mulheres, ou seja cerca de 30% da população feminina brasileira sofreu algum tipo de assédio. E o cruzamento dos dados salientou que 42% dos casos de violência contra a mulher têm como palco a própria casa das vítimas. Ao divulgar os números, a diretora do FBSP, Samira Bueno, chegou a comentar: “Ela (a mulher) está sofrendo violência dentro de casa, aí ela pega o metrô ou o ônibus para ir para o trabalho, onde também vai ser assediada. Qual é o lugar seguro, então? Ele existe?”
Mais estarrecedor que os números são as imagens concretas, reais e atualíssimas da violência. Não há como banalizar o problema quando, ao ler as notícias do dia, nos deparamos com o rosto desfigurado – obra de uma sequência imensa de chutes e de socos – da empresária carioca Elaine Caparroz, 50 anos. Para se recuperar das graves lesões, ela ficou internada quase dois meses no hospital. O mesmo ocorreu no início desse mês de março, no Espírito Santo: a vendedora Jane Cherubim, 36 anos, foi brutalmente espancada pelo companheiro e, em seguida, acabou abandonada em uma estrada rural. Só não morreu por detalhe. Quem não escapou da morte, aqui em Santa Maria, há poucas semanas atrás, foi a estudante universitária Fernanda Hoffmeister, 22 anos, que foi enforcada com um fio de computador pelo próprio namorado, segundo investigações da Polícia Civil.
A pergunta que acho que a sociedade gaúcha e brasileira tem que se fazer, a respeito do tema, é bem direta: quantas vidas mais nós vamos aceitar perder para a violência contra a mulher, para o machismo, para o sentimento de posse e para o ciúmes exacerbado? Nós, conjuntamente, vamos sentar e dizer que isso está insuportável e precisa verdadeiramente ser enfrentado ou vamos esperar para se rebelar contra isso apenas quando as nossas filhas, nossas sobrinhas ou nossas netas forem as próximas a terem a face mutilada ou serem assassinadas? Sim, porque, via de regra, a indignação acontece apenas quando alguém do entorno é a vítima. Só que um alerta é importante: essa realidade criminosa e vilipendiadora de mulheres está muito mais perto de todos nós do que podemos imaginar. Portanto, que a reação a isso seja ainda mais contundente do que foram os socos disparados contra a cabeça da Elaine Caparroz no momento que a mesma estava dormindo em sua casa.
O melhor meio de enfrentar isso, eu, de pronto, não saberia dizer. Imagino que a primeira providência seria pararmos de produzir desculpas que terceirizam a culpa para as próprias vítimas. Isso é ridículo. A culpa de quem bate é de quem ergue a mão. Não tem outro jeito de analisar isso. A segunda questão seria reconhecermos, que o machismo é muito mais presente no Rio Grande e no Brasil do que imaginamos. O machismo, na nossa sociedade, é uma patologia, é uma doença que precisa ser debelada.
Por último, nessa superficial análise, não me sai da cabeça outra frase dita pela diretora do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, a Samira Bueno: “menino que vê o pai bater na mãe tem forte tendência a também bater na esposa.” Portanto, fica a dica.
Em tempo: para fechar esse texto também dentro do tema “mulheres”, quero destacar a realização, nessa quinta-feira (28), da 3ª edição do Prêmio Mulheres de Luta, uma iniciativa do meu mandato parlamentar que homenageia mulheres de Santa Maria e do Rio Grande do Sul que reconhecidamente desenvolvem um papel importante na luta e no empoderamento feminino. Parabéns a todas as homenageadas desse ano, entre elas a Irmã Berenice da Silva, a agricultora Teolides Claro, a cantora Deborah Rosa, a Celita da Rosa, do Km 2, as enfermeiras Angela Flach, Soeli Guerra e Martha Souza, entre outras. Essas mulheres, gaúchas e brasileiras, fazem a diferença e ajudam, cada uma a sua maneira, a transformar a nossa dura realidade.
Foto: Marcos Santos /USP Imagens/fotospúblicas.com