Artigo – O Brasil faz gols, mas o “mercado” segue vaiando

Por Valdeci Oliveira –

Se alguém ainda tinha, por menor que fosse, alguma dúvida quanto aos reais interesses desse ente onipresente chamado “Mercado”, a incerteza foi dissipada com uma pesquisa recentemente divulgada apontando que entre gestores e analistas que atuam em fundos de investimento no eixo Rio-São Paulo, 90% deles avaliam como negativo o governo do presidente Lula. E isso depois que o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, ter anunciado medidas para conter o crescimento de gastos federais e cumprir com as regras do chamado arcabouço fiscal, exigências dos donos do dinheiro. Não satisfeitos, querem mais cortes – não importando onde, desde que não os atinja – e não somente as ações que diminuem R$ 70 bilhões em despesas do governo nos próximos dois anos. Também são contra a proposta de aumento do imposto de renda para quem ganha além de R$ 50 mil mensais em detrimento da isenção para aqueles que recebem até R$ 5 mil por mês.

Com a pesquisa, e diante dos resultados positivos que a economia brasileira vem insistindo em mostrar aos céticos, e que não justificariam tal rejeição, cai, definitivamente, a máscara do andar de cima, cuja fome por recursos é insaciável, mesmo que isso signifique tirar de quem já tem pouco para dar para quem não precisa.

O que me parece, na verdade, é que o topo da pirâmide vive uma realidade que simplesmente é inexistente, usada apenas para justificar o injustificável, o que torna a postura ainda mais chocante e vil. O “mau humor” dos endinheirados se dá diante de um país que tem uma inflação controlada (oposta ao do governo passado, que chegou a dois dígitos), desemprego em baixa – o melhor resultado em 12 anos -, aumento no consumo das famílias e PIB crescendo e superando as expectativas até mesmo dos mais otimistas. Fora isso, nossa balança comercial, que é a diferença entre o que compramos de fora e vendemos a outros países, deve fechar o ano com um superávit superior a US$ 75 bi, além de que o número de famélicos diminuiu sensivelmente de 2023 para cá, com 8,7 milhões de pessoas deixando de viver nessas condições.

Indicadores positivos, ambiente de negócios favorável, imagem do país respeitada internacionalmente, população consumindo, empresas produzindo e investimentos públicos e privados mostrando vigor. Nada disso parece importar, pois o que vale é o que disse uma famosa comentarista econômica: o mercado hoje está comprando e vendendo pessimismo. Para quem está acostumado com esse tipo de ”birra”, considerando o DNA de quem a faz e conhecendo um pouco dos meandros que regem as movimentações do mercado especulativo, isso tudo é sinal de que o governo está no caminho certo.

Esse mesmo mercado que torce o nariz para o presidente Lula não foi e nunca será “tocado”, por exemplo, pelos desmandos e irresponsabilidades que fizeram do Brasil, que possui 3% da população mundial, ter tido mais de 10% dos óbitos mundiais por conta da covid-19. Da mesma forma, nenhum desses analistas perde o sono ou deixa de investir por aqui mesmo diante das atrocidades e violências cometidas pela polícia militar de São Paulo, estado mais rico da Federação e o coração dos investidores, onde o maior perigo hoje é você ser jovem, negro, morador da periferia e encontrar pela frente uma equipe de homens da lei. E quem diz isso é o Ministério Público, que aponta que esse tipo de crime aumentou, até o momento, 46% se comparado a 2023 e 94% no 1º bimestre de 2024. O sintomático, no caso, é que mesmo diante de tanta atrocidade e violência, o dólar não subiu e a bolsa de valores não caiu.

Essa é também a turma que nunca condicionou suas análises, que no caso atual podemos chamar de chantagem, à defesa e respeito à Democracia, à inclusão social, à criação de políticas públicas que possibilitem ao filho do pobre cursar faculdade. Pelo contrário, são justamente medidas que colocam o povo no orçamento (e o rico no imposto de renda) a matéria-prima para a criação de factoides e falsos fantasmas que procuram assustar a sociedade.

Por eles, a taxa de juros pode aumentar – e é até desejável que isso aconteça -, pois assim ganham milhões num apertar de botões. O fato de que o próprio Banco Central, nossa autoridade monetária que, em tese, deveria zelar pela economia nacional, mas que na prática se mostra representante dos interesses do tal mercado, simplesmente cruza os braços diante da subida do dólar e não atua na venda da moeda, para baixar seu preço, mostrando assim a antipatia preconceituosa e ideologicamente nociva que os operadores e gestores financeiros tem por governos progressistas. Para efeito comparativo, durante o governo passado o BC usou 113 vezes esse expediente. No governo Lula, apenas uma.

Diante de tanta obviedade, a certeza que fica é que o mercado ganha – ou pelo menos nunca perde – com a pobreza. Se dependesse dele, Bolsa Família seria extinto, salário mínimo não teria reajuste, aposentadorias seriam congeladas e saúde pública somente para, no máximo, indigentes. A única coisa que não pode é cobrar imposto de rico.

Foto: Portal Terraço Econômico