Por Valdeci Oliveira –
Desde que a polarização política se incorporou ao cotidiano nacional, o governador Eduardo Leite busca se descolar daquilo que ele próprio ajudou a eleger e busca mostrar um perfil democrata, de diálogo. Da mesma forma, para não desagradar esse mesmo lado, busca, sempre que possível, se diferenciar das forças políticas progressistas e populares que gravitam no entorno do presidente Lula.
Buscando não ser uma coisa nem outra, o chefe do Executivo estadual acaba, digamos, sem identidade definida e faz como o dito popular: uma no cravo, outra na ferradura. Quanto ao primeiro grupo, aquele mais radical, não sei, mas, em relação ao presidente Lula, o governador não precisa se preocupar: ambos são tão diferentes que não há ‘risco’ de confundi-los, uma vez que o ocupante do Palácio do Planalto tem trabalhado pela coesão nacional, pela distribuição justa das obrigações e direitos, demonstra compromisso com as políticas de enfrentamento à fome, controle da inflação e não costuma terceirizar suas responsabilidades, pontos que inexistem no plano de trabalho do chefe do Executivo estadual.
Já é tema corrente – e consolidado -, tanto na oposição quanto entre inúmeros parlamentares que formam sua base de apoio no Parlamento gaúcho, que ao governador falta ‘palavra’. Das promessas de campanha, incluindo a que lhe deu o primeiro mandato, uma a uma, conforme o andar da carruagem, foi caindo por terra, principalmente quando o tema dizia respeito à entrega do patrimônio público.
A esse sentimento, somou-se outra quebra do que foi empenhado aos eleitores, quando a estes foi pedido voto para retornar ao Palácio Piratini para mais quatro anos frente à administração do estado: a de que não iria aumentar os impostos se reeleito fosse. Passados poucos meses de sua posse ao novo e segundo mandato, o atual mandatário do Palácio Piratini ultrapassou mais uma linha da divisa entre o dito e o feito.
Na prática, o governador imitou em ato a justificativa do então ministro do trabalho da Ditadura Militar, Jarbas Passarinho, que mandou ‘às favas todos os escrúpulos de consciência’ quando votou favoravelmente, na reunião do Conselho de Segurança Nacional, em 1968, pelo endurecimento do governo contra os opositores do então regime.
Por não ter conseguido levar adiante seu projeto que aumentaria de 17% para 19,5% a alíquota de cobrança do Imposto sobre Circulação de Comércio e Serviços (ICMS), medida escorraçada, inclusive, por parlamentares que o apoiam, o governador optou por, novamente, quebrar a palavra empenhada e compensar sua derrota com a retirada e cortes em benefícios fiscais que recaem diretamente sobre mais de 60 setores produtivos e impactam negativamente também sobre produtos que compõem a cesta básica das famílias gaúchas.
Por óbvio, além do baque na competitividade das nossas empresas, o peso será mais sentido nos lares de baixa renda, mas também naqueles que integram o largo espectro do que se convencionou a chamar de classe média. No caso da cesta básica, os produtos que dela fazem parte, todos essenciais, ressalte-se, que atualmente são isentos ou com até 7% de ICMS, passarão a ter cobrança de 12%. E se considerarmos que a cesta básica no RS já é uma das mais caras do país, não fica difícil imaginar o tamanho da dificuldade que será adquiri-la por grande parte da população.
E nesta espécie de chantagem política, até agora, o governador, como num jogo de pôquer, está pagando para ver, ignorando que o desempenho da economia gaúcha, que já vinha tendo resultados abaixo da média brasileira, fechou o ano passado como o pior do Brasil. E falo de números oficiais como o apontado pelo Índice de Atividade Econômica Regional do Rio Grande do Sul (IBCRRS), calculado pelo Banco Central: crescemos apenas 2,1% em 2023, contra 2,4% na média nacional. Em 2022, registramos uma queda de 1,2% contra um avanço de 2,8% do país. E a nossa produção industrial retrocedeu quase 5% no ano passado, conforme o IBGE.
Mas nem tudo está perdido. Como forma de barrar a medida, a bancada do Partido dos Trabalhadores na Assembleia Legislativa protocolou Projeto de Decreto Legislativo (PDL) – que se encontra em tramitação – para sustar os decretos insanos do Sr. Eduardo Leite que, como de costume, tira de si a responsabilidade e a joga para o governo federal e a uma suposta perda de receita ao RS trazida pela Reforma Tributária, o que, como já foi provado, não se sustenta.
Ao lado do setor produtivo, dos trabalhadores e da população, cerramos fileiras e vamos continuar trabalhando com vigor e responsabilidade para barrar mais este desmando de um gestor que é muito bom de marketing, mas que não possui um projeto consistente que seja para dinamizar de fato a nossa economia e impulsionar o desenvolvimento gaúcho.
O RS merece mais.
(Foto: Arquivo Tribuna do Norte)