Por Valdeci Oliveira –
Dentre as várias tradições do nosso estado, tem uma que nos é muita cara e sempre foi exaltada como uma das nossas melhores características, que é a confiança, o tal ‘fio do bigode’. A figura de linguagem não surgiu aqui e não se sabe ao certo onde e quando – parece que foi na antiga Alemanha.
Segundo o Museu da Língua Portuguesa, como o bigode era considerado símbolo de homem honrado e com vergonha na cara (quando acompanhado pela barba), trazia junto o significado de que bastava prometer algo verbalmente, sem a necessidade de papel assinado.
Mas para a nossa tristeza, ele, o fio do bigode, que já valeu algo por aqui, hoje, diante de tanta quebra de palavra daquele que deveria ser o exemplo, não passa de uma simples penugem a habitar um rosto imberbe.
A proposta do governador Eduardo Leite na questão do aumento de impostos, via elevação do ICMS, foi mais uma entre várias outras quebras de palavra desde que assumiu pela primeira vez o nobre cargo de chefe do executivo estadual.
E a derrota do projeto, em que foi obrigado a retirar da pauta na última terça-feira (19) diante da iminente derrota, inclusive acompanhada por deputados e deputadas de sua base aliada, foi a resposta da população.
Ao mesmo tempo, antevendo que perderia “de goleada”, o governador, ao invés de oferecer um projeto de desenvolvimento sério e sustentável, busca aumentar a arrecadação por meio de um aumento que eleva para 12% o imposto sobre itens da cesta básica e retirando subsídios a diversos setores econômicos.
Atualmente, esses produtos estão isentos ou sujeitos a uma alíquota de 7%. Ou seja, nem a barba que traz no rosto é suficiente para que o chefe do executivo rio-grandense tenha vergonha na cara. Com a chantagem – ou aumento na alíquota de ICMS ou retirada de subsídios – jogada no colo de todos os parlamentares, o governador esperava ter aquilo que não teve. E como não conseguiu respaldo em seu plano A, resolveu se vingar justamente em cima do lado mais fraco a partir de um plano B.
Nunca é demais lembrar – antes que digam que falar é fácil – que em nenhum dos governos do PT no RS, com Olívio Dutra e depois com Tarso Genro, houve elevação de impostos. Pelo contrário, com Olívio o que houve foi uma redução de alíquotas, antes majoradas pelo então governador Antônio Britto.
O que buscamos fazer quando estivemos à frente da gestão gaúcha foi debater, de forma ampla, democrática e transparente, projetos de mudança na matriz tributária, que buscava fazer uma justa redistribuição na carga de impostos, trazendo benefícios para mais de 40 setores, da indústria de alimentos passando pela proteína animal, produtos de consumo popular e aos pequenos empreendimentos. Mesmo esta proposta não sendo acolhida pela Assembleia, com as políticas de desenvolvimento implementadas na época, fizemos com que o PIB do RS crescesse mais que o nacional naquele período.
O que difere ainda mais as posturas adotadas, é que o atual governador apresentou sua proposta de forma autoritária, arrogante e prepotente, pois não discutiu com ninguém, deixando seus apoiadores atordoados diante de tanta explicação que eram obrigados a dar Rio Grande afora.
E de qualquer forma, esse tema – seja ampliação da carga tributária ou retirada de benefícios ou subsídios a setores econômicos – está completamente fora de contexto, pois, além das repetidas estiagens e enchentes que assolaram o estado, que somente agora começamos a nos recuperar, ela vem num momento em que a economia começa a se restabelecer e reagir. É uma espécie de balde água fria sobre a produção e na geração de emprego.
E a quebra de palavra já havia sido demonstrada quando, apelando para a saúde financeira do estado, firmou acordo com a nossa bancada, em 2018, na transição, e em 2020, para que a alíquota não fosse reduzida (o aumento feito pelo então governador Sartori cairia e diminuiria significativamente a entrada de recursos nos cofres do estado, comprometendo políticas públicas importantes para a população).
Mas Eduardo Leite não cumpriu o combinado e não aplicou a redução da carga tributária sobre o gás de cozinha e o consumo de energia entre 50 e 100 Kwh. E durante a pandemia, não fez a ampliação na aplicação em saúde através da oferta de vacinas. E lembro bem na última campanha eleitoral do então candidato tucano dizendo aos quatro ventos que as finanças públicas estavam recuperadas.
E para não deixar dúvidas quanto à sua postura irresponsável, dias atrás foi desmentido em público em seu principal argumento, de que o RS perderia receita com a Reforma Tributária realizada com muito esforço e negociação pelo governo Federal com os estados e Congresso Nacional.
Senhor governador, a população gaúcha não deve arcar com as consequências da sua gestão inadequada. Mas felizmente, ninguém mais cai no seu discurso e teremos um Natal e Ano Novo sem tarifaço.
Não basta falar manso. É preciso fio de bigode.