Artigo – Mobilização a favor da enfermagem e da saúde de todos e todas

Por Valdeci Oliveira –

Quem milita na política tem muito claro que conquistas, avanços e garantias de direitos somente são adquiridos com muita luta, mobilização e organização. Independentemente de quem está no chamado “poder”, este estará sempre em disputa pelas forças que o compõem ou lhe dão sustentação. E em se tratando de governos pouco afeitos à justiça social e a participação e controle da sociedade sobre seus atos, mais se faz necessário que a premissa seja fortalecida, compreendida e colocada em prática. E este é o caso dos enfermeiros e enfermeiras brasileiros, categoria que, incluindo técnicos e auxiliares, não deixou dúvidas quanto a sua importância e relevância desde que a Organização Mundial de Saúde (OMS) declarou, no início de 2020, que o mundo estava vivendo uma pandemia. Sem diminuir ou relativizar o trabalho de médicos e cientistas, foi a enfermagem que esteve, desde o primeiro minuto, na linha de frente no atendimento à população. Também foi ela, com o desenvolvimento das vacinas, a responsável, no serviço público, pela sua aplicação.

Desde maio passado, quando a Câmara dos Deputados aprovou o projeto apresentado pelo senador Fabiano Contarato (PT-ES), criando o piso salarial para esses trabalhadores e trabalhadoras, cerca de 3 milhões de profissionais ainda não viram o resultado prático em seus contracheques. Isso porque, para que haja garantia jurídica, os parlamentares federais terão ainda de aprovar outro projeto, este de emenda constitucional (PEC 11/22), que no momento está sendo analisado na comissão especial criada para este fim. Mas em se tratando de política, a possibilidade de algum revés está sempre à espreita, mesmo nas causas mais justas. Por isso, é necessário estarmos atentos, pressionando e permanecendo firmes para que a discussão e tramitação do texto não fiquem paradas.

Há mais de uma década, tenho me somado à defesa do conceito de que o acesso da população a um serviço público de saúde universal e de qualidade passa, inexoravelmente, pela valorização de quem nele atua, pela garantia e ampliação dos recursos orçamentários para a área e pela criação de políticas públicas que deem conta da demanda da sociedade gaúcha e brasileira.

E a partir desse entendimento, moldado com muito debate e transparência, temos buscado construir alternativas no Legislativo estadual. Foi neste sentido que, juntamente com as entidades de classe e da sociedade civil que atuam a partir desta mesma perspectiva, elaboramos um projeto com vistas à garantia dos direitos dos trabalhadores do segmento, principalmente aqueles ligados a hospitais vinculados ao Sistema Único de Saúde (SUS). Entre as diretrizes do PL 304/21, a previsão de que na distribuição e repasses dos recursos financeiros do SUS seja priorizado o pagamento dos salários, das verbas rescisórias, dos depósitos de FGTS e demais recursos de natureza alimentar.

E nessa mesma linha protocolamos outra proposta no sentido de proibir o funcionamento no RS de cursos de graduação e de nível técnico na área da saúde na modalidade de ensino a distância, diretriz que dialoga com uma demanda dos diferentes conselhos regionais e com a posição defendida pelo Fórum dos Conselhos Federais da Área da Saúde, de que essas profissões, que lidam com riscos no seu cotidiano, precisam ter sua formação prática associada ao cuidado presencial para  que não se comprometa a segurança do processo.

Outro exemplo nesse sentido é a matéria que dispõe sobre as condições de descanso intrajornada dos profissionais de enfermagem durante o horário de trabalho. Também via projeto de lei, o nosso mandato propôs (o PL 33/2017) que as instituições de saúde, públicas e privadas, nos intervalos para repouso das equipes, ofertam aos seus trabalhadores locais arejados, providos de mobiliário adequado, dotados de conforto térmico e acústico, equipados com instalações sanitárias e área útil compatível com a quantidade de profissionais em serviço.

Isso tudo parece óbvio, mas, na vida prática, tais medidas costumam encontrar grandes resistências, principalmente de quem vê a saúde como gasto e não como investimento ou, pior ainda, apenas como um lucro a ser buscado. Não fosse assim, esses encaminhamentos já teriam sido levados a plenário e aprovados.

Cada vez mais temos, enquanto sociedade, de ter a clareza de que toda e qualquer conquista na área não beneficia apenas os profissionais da enfermagem – cuja maioria é formada por mulheres e precisa fazer dupla jornada de trabalho para conseguir uma remuneração melhor -, mas todo o escopo da saúde pública brasileira, principalmente os usuários.

Como a vida tem nos ensinado, se não houver mobilização, nos estados e em Brasília –  e a Frente Parlamentar por nós coordenada tem este objetivo -, a efetivação do piso salarial da enfermagem, infelizmente, corre o risco de não ser efetivada e se tornar letra morta na lei.

(Artigo originalmente publicado no site www.claudemirpereira.com.br)

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