Por Valdeci Oliveira –
Seguir o senso comum para se posicionar diante de temas sérios, de grande relevância ou que chamam a atenção da sociedade sempre foi a receita indicada, a mais fácil para quem não quer se incomodar ou carregar nas costas o peso da responsabilidade. Para alguns, a minha escolha, juntamente com a da minha bancada, em votar pela manutenção das alíquotas do ICMS por um ano (e não por 3 como previa projeto original do Executivo), teria sido contraditória, pois na eleição de 2018 o voto popular me colocou na oposição ao atual governo. Um raciocínio simplista, que ignora toda uma conjuntura, e não leva em conta o principal: de termos, diante da inação do governo federal, a possibilidade concreta de adquirirmos vacinas contra o coronavírus em quantidade suficiente, sem distinção, e no menor espaço de tempo possível.
Entre ficar na confortável posição do “contra o aumento de impostos” ou ao lado da vida, não tive dúvidas e fiquei com a segunda. Preferi ignorar o senso comum e abraçar com todas as minhas energias o bom senso, mesmo divergindo do governo em inúmeras questões, principalmente quanto ao papel e à responsabilidade do estado para com sua população.
Se para muitos é difícil entender, tenho a obrigação, enquanto homem público eleito, de explicar, quantas vezes forem necessárias. No final do ano passado, o Executivo gaúcho enviou para a Assembleia um projeto de lei majorando as alíquotas do ICMS por mais três anos. Alíquotas estas que haviam sido elevadas em 2015, no governo Sartori, ocasião em que juntamente com meus colegas de partido votei contra, pois naquele momento não havia argumento que justificasse o aumento. E o tempo cuidou de mostrar que tínhamos razão.
Hoje temos uma pandemia fora de controle, uma economia esgualepada, um sistema de saúde quase colapsado e milhares de sonhos sendo ceifados diariamente. São dramas que só serão combalidos se tivermos vacinação em massa. E a maior parte dos setores da sociedade que foram contrários à majoração do imposto, que na prática se tratou de manutenção de índices e não de aumento simples, é a mesma que se coloca contra as medidas de isolamento para contermos o avanço da pandemia. E o faz porque não acredita na virulência do caos sanitário. A depender desse segmento, medidas de contingenciamento, de isolamento social ou interrupção de atividades econômicas, mesmo que por um período, como vemos em países ditos desenvolvidos, assim como a concessão de auxílios econômicos ao povo mais vulnerável, são sacrilégios. Para essa parcela, manter alíquotas de impostos que já vinham sendo cobradas desde o governo anterior é algo impensável. E, ao mesmo tempo, aceita como inevitável que trabalhadores continuem a se infectar utilizando um transporte público lotado e que profissionais da saúde tombém exaustos diante da grande e insana carga de trabalho. Afinal, argumentam essas pessoas, num misto de hipocrisia, cinismo e ignorância, isso faz parte da vida, e a morte – mesmo que evitável – faz parte do ciclo natural da existência humana.
Não penso assim. Minha bancada não pensa assim. E por isso, após muito debate interno, informamos, no final de 2020, durante reunião com o governador Leite, que apoiaríamos sua proposta se em contrapartida ele aceitasse duas condições: que a medida valesse apenas por 12 meses (e não pelos 36 inicialmente propostos), além de utilizar parte dos recursos para a compra de vacinas a toda população gaúcha. Cumprimos a nossa parte, apresentamos uma emenda com esses pontos à matéria e, na última terça-feira, o governador cumpriu a sua ao encaminhar para o Parlamento projeto alterando a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), que foi aprovado por unanimidade de todos os partidos, garantindo no caixa do governo dinheiro para a aquisição de imunizantes.
Não precisamos ser doutores para imaginar como seria o enfrentamento da pandemia pelo estado reduzindo a sua arrecadação justamente no momento da maior crise sanitária já enfrentada por nós em mais de um século. Seria colocar o governo de joelhos e diante de uma eterna “Escolha de Sofia”, tendo de optar entre educação, segurança, infraestrutura ou saúde. Emparedar o Poder Executivo certamente traria dividendos eleitorais, mas, neste momento, seria uma verdadeira irresponsabilidade política, algo impensável para mim.
Ir contra o senso comum e abraçar o bom senso deve ser uma obrigação moral de qualquer gestor ou parlamentar. E na atual conjuntura, o bom senso atende pelo nome de vacina e vale todo o esforço, mesmo que isso resulte em ataques orquestrados pelas versões gaúchas dos “gabinetes do ódio”, principalmente nas redes sociais.
Com os recursos do ICMS, temos agora algo em torno de R$ 1,5 bilhão para investirmos na compra de vacinas junto aos laboratórios. Mas somente me darei por satisfeito quando as seringas alcançarem os braços de todos os gaúchos e gaúchas, quando as pessoas puderem sair às ruas com segurança e quando os médicos não terem mais de escolher quem tem mais chances de sobreviver.
(Artigo originalmente publicado no site www.claudemirpereira.com.br)