Artigo – Uma “nova revolução” para o Rio Grande

Por VALDECI OLIVEIRA

Nesta semana, e mais especificamente nesta sexta-feira, comemoramos uma data muito cara para nós, gaúchos e gaúchas. O 20 de Setembro remonta e simboliza a deflagração de um movimento de insatisfação e de insubordinação do Estado do Rio Grande do Sul – nos idos de 1835 – ao Poder Central da época, contra os altos impostos que o Império Português aplicava sobre os nossos principais produtos, que resultava numa competição injusta e desigual com os outros países aqui do hemisfério.

Longe de querer desmerecer tão nobre data, momento histórico da nossa formação enquanto povo, é importante também que tenhamos claro que esse movimento partiu das nossas elites econômica, intelectual e militar e não do povo explorado, sofrido e perseguido por sua condição social ou racial. Este povo foi, isto sim, chamado apenas para dar sua vida na defesa dos interesses de quem detinha e queria ampliar seu poder local. Essa é a nossa História, queiramos ou não, gostemos dela ou não. Uma História que não necessariamente precisamos negar ou nos envergonhar. Muito pelo contrário: com ela devemos aprender.

Ao lembrar do 20 de Setembro, não podemos nos esquecer das camadas mais empobrecidas da nossa população, formada pelos negros e negras escravizados, dos índios e dos pobres que foram – em sua grande maioria obrigados – enviados aos milhares para as frentes de batalha, sem entender muito o que acontecia, se aquilo que estavam fazendo ou participando dizia respeito aos seus verdadeiros interesses, se aquela guerra era ou não sua. Esses heróis e heroínas também precisam ser lembrados. Suas histórias também precisam ser contadas, trazidas à tona, reveladas e reverenciadas.

Que aproveitemos, então, essa data para repensarmos, discutirmos e analisarmos a situação do nosso estado atualmente. A conjuntura exige que cerremos fileiras em defesa do patrimônio dos gaúchos e gaúchas, na defesa dos direitos de quem mora, vive e trabalha neste solo, direitos daqueles que dão seu suor – e muito da sua vida – para a construção da nossa riqueza.

É, sem dúvida, um momento que, talvez, nos exija fazer, ou, pelo menos, tentar buscar, uma “nova revolução”. Todavia, não pelas armas, não pela guerra, não com a morte de irmãos e irmãs. Uma revolução que resgate nosso orgulho, que prime pela resistência ao desmonte da coisa pública, pela resistência à precarização dos serviços públicos em saúde, educação e segurança. Que prime pelo direito a se ter um emprego, renda e uma vida digna.

Uma revolução que leve em conta que direitos existem para serem atendidos, usufruídos. Que leve em conta que conquistas civilizatórias existem para serem defendidas e mantidas. Uma revolução que extirpe de uma vez por todas as chagas do machismo, que leva a dor e a morte a milhares de mulheres; do racismo, que carimba na face das pessoas a marca da exclusão e do preconceito; e a chaga da exploração do mais forte sobre o mais fraco.

Uma revolução que considere a vida das pessoas mais importante que os lucros e os interesses da poderosa indústria dos agrotóxicos. Uma revolução que acredite na força da juventude e na experiência dos mais velhos, independentemente do sexo, do credo e da condição social. Uma revolução que enxergue o ser humano em sua plenitude e não somente como um número, uma matrícula, um custo.

Precisamos de uma revolução que enxergue o povo como sujeito partícipe e não como mero expectador dos acontecimentos, um simples pagador de impostos e um eleitor a cada dois anos. Enfim, uma revolução em seu mais amplo significado, de mudança, que substitua o discurso da crise infinita – que vem sendo repetido diuturnamente nos últimos anos – por ações políticas que efetivamente nos tragam o desenvolvimento e a inclusão social aos menos favorecidos. Uma revolução que distribua a renda hoje tão concentrada nas mãos de uns poucos privilegiados.

Portanto, que, neste 20 de Setembro, o espírito farroupilha nos motive, uma vez mais, a nos mobilizar contra injustiças, desigualdades, violências e toda e qualquer forma de opressão. Que busquemos, de forma incansável, a construção de um Rio Grande justo, solidário, desenvolvido, inclusivo e vocacionado para a paz. Que possamos, sempre que possível, trabalhar unidos para permitir as transformações que tanto desejamos e que tanto são necessárias, pois, como mostra a história do Rio Grande, é com suor, dedicação e comunhão de esforços que o nosso Estado avançará.

Viva o nosso 20 de Setembro!

Imagem: reprodução de obra de Thiago Krenning