Mudança no modelo de pedágios já está decidida, diz Valdeci

Notícia do Jornal do Comércio de 27/02/2012

O novo líder do governo na Assembleia Legislativa, Valdeci Oliveira (PT), garante que o Executivo buscará um novo modelo de concessões de rodovias para o Rio Grande do Sul. E descarta a hipótese de continuidade dos atuais contratos, levantada após encontros de representantes do governo Tarso Genro (PT) com as empresas. Ele ressalta que já é certa uma mudança na forma dos pedágios. 

Valdeci sustenta que há consenso no Palácio Piratini de que os contratos, que terminam no final do ano que vem, não devem ser renovados. “O governador tem uma posição absolutamente clara de não renovação dos contratos.”

O petista também defende a proposta de calendário do pagamento do piso nacional do magistério apresentada na sexta-feira. O líder do governo no Parlamento analisa que, conforme o projeto, o reajuste aos professores em quatro anos será o maior já concedido à categoria. Nesta entrevista ao Jornal do Comércio, Valdeci ainda fala das atividades legislativas em ano eleitoral e defende o nome do deputado federal Paulo Pimenta para ser o candidato do PT em Santa Maria, município que ele comandou duas vezes.

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Jornal do Comércio – Em 2011, a Assembleia aprovou a maioria dos projetos do governo Tarso. Qual a meta para esse ano?

Valdeci Oliveira – São vários projetos: tem a proposta do magistério que já está na Casa e a que foi anunciada pelo governo na sexta-feira, com um cronograma para atingir o piso nacional até 2014. A proposta do Executivo – somando-se aos 10% do mês passado e aos 23,5% anunciados no início deste ano – é o maior reajuste dado ao magistério na história do Rio Grande do Sul em apenas quatro anos. É um compromisso de governo.

JC – Mas a categoria ainda demonstra insatisfação.

Valdeci – Vamos chegar a 2014 cumprindo o pagamento do piso. Se pegarmos o governo Yeda (Crusius, PSDB), foi 6% de reposição parcelada. O governo Tarso está dando quase 100% de reajuste em quatro anos. É parcelado, mas todo mundo sabe que não existe disponibilidade orçamentária, por mais que houvesse vontade política de garantir algo mais rápido do que está sendo proposto.

JC – Por que algumas categorias, como professores e oficiais da Brigada Militar, reclamam da falta de diálogo?

Valdeci – É responsabilidade de um governo a apresentação de um conjunto de projetos, que não necessariamente precisa ser rigorosamente debatido com os setores. O governo apresentou ao Cpers um conjunto de propostas no ano passado. Foram cumpridas quase todas as reivindicações feitas naquele momento. Neste ano, o Executivo não recebeu resposta à proposta dos 23,5%. Parece-me que o Sindicato dos Professores está querendo fazer disputa política, mas a base do magistério deve aprovar a oferta do governo.

JC – Outras categorias também reclamam aumentos. Há previsão orçamentária para conceder mais reajustes?

Valdeci – Ao longo de muito tempo houve um sucateamento de todos os setores. O projeto do Estado mínimo foi implementado com radicalidade no Rio Grande do Sul, com um desmonte da estrutura pública, causando uma demanda reprimida em todas as categorias. Então, quando o governo começa a sinalizar para uma categoria, todos querem. E todas as áreas estão sendo atendidas. Nos próximos dias, por exemplo, será apresentada uma proposta para o quadro geral do Estado, contemplando as categorias que menos ganham.

JC – E que outros projetos do Executivo serão prioridade?

Valdeci – Um projeto necessário, já protocolado na Casa, é o que cria o Plano de Cargos e Salários da Uergs (Universidade Estadual do Rio Grande do Sul). Com esse projeto, restabelecemos a Uergs como indutora do desenvolvimento regional, ela estava liquidada, sucateada. A Uergs vem perdendo uma quantidade enorme de professores, funcionários e técnicos para outras instituições porque o salário não motiva a fazer o concurso.

JC – O que mais deve ter atenção da base aliada?

Valdeci – O piso regional entra na pauta em março, deve ter debates acalorados, mas não haverá grande dificuldade de aprovar. Essa construção já foi feita no Conselhão. O importante é que o governo Tarso está começando a recuperar o valor do piso que havia se perdido há muito tempo. Se não surgir fato novo, os assuntos mais “polêmicos” serão a questão do magistério, da segurança pública – principalmente o pessoal da base e da Polícia Civil – e os pedágios, que não é uma polêmica, mas se configura como um debate.

JC – Partidos que integram a base aliada, como o PSB, manifestaram interesse em discutir a proposta. Também há receio na bancada petista de que o governo dê continuidade aos contratos vigentes atualmente…

Valdeci – O governador tem uma posição absolutamente clara de não renovação dos contratos dos pedágios, das concessões. Há uma coesão dentro do governo de que esse modelo vigente está completamente falho e deve ser mudado. Se tiver pedágio no Estado, não pode ser esse modelo. Pode ser comunitário, público ou ainda outra forma. Mas o governador não vai deixar de fazer o que ele se comprometeu.

JC – E os projetos apresentados pelo Executivo no ano passado que não tiveram consenso na base, como a inspeção veicular e as Casas da Solidariedade?

Valdeci – Vamos retomar a inspeção veicular nos próximos dias com a bancada do PT, e, logo em seguida, vamos fazer uma reunião com a Casa Civil e todos os líderes dos partidos da base. Esse projeto não é novo, é uma regulamentação que já está determinada pelo Contran (Conselho Nacional de Trânsito), que mais cedo ou mais tarde vai ser colocada para o Rio Grande do Sul. O que temos que definir é a forma: se a inspeção vai ser feita pelo Estado, se haverá parceria com os municípios, qual será o valor da taxa…

JC – A bancada do PMDB já declarou que fará oposição à cobrança da taxa. E parte dos aliados não apoia a cobrança.

Valdeci – Essa não é uma questão fechada. O governo não tem nenhuma visão arrecadatória e está disposto a negociar, quer achar uma saída para que a inspeção seja feita e que se encontre uma maneira de fazê-la.

JC – E a proposta de criar as Casas da Solidariedade?

Valdeci – Houve 12 ou 13 audiências públicas em várias regiões do Estado, com uma série de ideias para aperfeiçoar o projeto. A resolução foi encaminhada para a Casa Civil e nos próximos dias estaremos conjugando essas propostas para tentar negociar.

JC – Aliados e oposição temem que o projeto seja usado politicamente.

Valdeci – Isso faz parte da disputa política, mas transformar algo que até então era privativo em uma política pública, sob o controle da sociedade e entidades credenciadas que irão gerenciar, me parece muito diferente do que se tinha até então. É bastante produtivo, principalmente para cidades do Interior que passam enormes dificuldades. A própria oposição já disse que irá votar conosco, queremos arredondar o projeto porque há dúvidas se iria se enquadrar na área social ou da saúde.

JC – A propósito, o ritmo das votações deve ser diferente em função de ser um ano eleitoral?

Valdeci – Os projetos mais importantes deverão ser votados, se conseguirmos encaminhar até abril. A partir de junho, os debates vão se concentrar no processo eleitoral. Todos os deputados estarão participando direta ou indiretamente das campanhas e se deve ter cuidado para não gerar questionamentos desnecessários.

JC – As eleições podem afetar as relações entre os partidos e o governo?

Valdeci – Acho que não. Talvez as grandes cidades possam ter “um respingo” aqui na Assembleia, mas a grande maioria dos municípios não. Estarei defendendo candidatos do partido (PT), mas tendo cuidado para não criar atritos desnecessários – isso é fundamental. Teremos vários lugares no Estado onde a base do governo vai estar dividida e ao mesmo tempo em que a base nacional estará disputando com setores da base estadual. Temos que ter sabedoria para lidar com isso.

JC – Alguns deputados petistas estão insatisfeitos com o espaço no poder ocupado por outros partidos e se sentem incomodados com a acusação de incoerência, dadas às mudanças de posicionamento. Como equacionar as insatisfações dentro da bancada do PT?

Valdeci – O governo Tarso conseguiu construir uma base de apoio extraordinária, afinada e com um compromisso com esse governo e o nosso programa. Tem votado todos os projetos sem nenhuma dificuldade. Quando a oposição diz que a bancada do PT não tem coerência é porque nunca foi governo; ser governo significa às vezes abrir mão de algumas questões em prol da governabilidade. Não quer dizer que a bancada do governo concorde em todos os pontos que são encaminhados, estamos debatendo e discutindo sempre. Não é fácil ter uma bancada de 14 deputados em que cada um tem o seu ponto de vista. Mas foi e será, com certeza, uma bancada governista e coesa.

JC – Como lidar com as exigências das outras bancadas?

Valdeci – A base aliada tem vários partidos e cada um tem seu ponto de vista. Se não fosse assim, seria um partido só. Devemos ter a capacidade de fazer essa relação, de ouvir, dialogar, ponderar quando for necessário, mas também de repartir espaços na Casa, como as relatorias de projetos importantes e comissões. Esse é o esforço que fizemos no ano passado e faremos neste ano: não criar atrito ou disputa desnecessários. Cada voto tem o mesmo peso, então, devemos ter tratamento igual para todos, seja uma bancada pequena ou grande.

JC – A oposição reclama da falta de diálogo e de negociação com o governo.

Valdeci – Mais debate? Bom, é legítimo e respeitamos. Mas se olharmos o uso da tribuna, quem mais debate, questiona e coloca seu ponto de vista é a oposição. Quero manter o diálogo aberto, sem abrir mão das nossas posições. Tenho, por exemplo, uma divergência política com o (deputado tucano Jorge) Pozzobon – nós dois somos de Santa Maria. Mas somos amigos, dialogamos. Agora, ele é oposição e eu situação. Tenho conversado com os líderes, mas se não houver o debate e a divergência, não é o Parlamento. O Parlamento deve ter o contraditório.

JC – Outra crítica é direcionada ao uso do regime de urgência, que limita a análise dos projetos a um mês.

Valdeci – Se fizermos um levantamento dos governos, sem exceção, todos utilizaram esse artifício. É importante dar agilidade, o tempo do Executivo é rápido, é diferente do tempo do Legislativo.

JC – Mas se questiona o excesso de projetos protocolados em regime de urgência.

Valdeci – Aí depende da opinião. Todos os projetos que vieram com regime de urgência eram absolutamente necessários para a reestruturação do Estado.

JC – E por que propostas, como a inspeção veicular, perderam o regime de urgência?

Valdeci – Porque percebemos que, se esses ganhassem um pouco mais de tempo, não prejudicariam a reestruturação e a reorganização da máquina pública.

JC – Como o senhor analisa o PT e o quadro eleitoral em Santa Maria?

Valdeci – O PT terá candidato (a prefeito). Ainda não foi definido quem, mas não há outra possibilidade, fomos governo por oito anos. Eu não serei candidato por dois motivos: já fui oito anos prefeito e me comprometi, durante a campanha, de cumprir o mandato de deputado – e a coerência é fundamental na política. Meu candidato é o deputado federal Paulo Pimenta. Se não for ele, será o (secretário estadual da Justiça e dos Direitos Humanos) Fabiano Pereira. Não existe disputa. O primeiro que disser que quer será o candidato de consenso.

Perfil

Antônio Valdeci Oliveira de Oliveira, 54 anos, nasceu em Dilermando de Aguiar (RS) – na época, distrito de Santa Maria. Até os 18 anos, trabalhou na propriedade dos pais, agricultores, e interrompeu os estudos na 5ª série. Cumpriu serviço militar em Santa Maria, trabalhou por um tempo como metalúrgico em Porto Alegre e voltou a Santa Maria no início dos anos 1980. Cursou o Ensino Médio e a Faculdade de História do Centro Universitário Franciscano até o sétimo semestre. Sua atividade política teve início no Sindicato dos Metalúrgicos de Santa Maria, do qual foi secretário-geral e presidente. Filiou-se ao PT em 1986. Elegeu-se vereador em 1988, sendo reeleito em 1992. Dois anos mais tarde, concorreu a deputado federal – suplente, assumiu o mandato em 1997. Em 1998, tentou novamente uma vaga na Câmara dos Deputados e se elegeu. Deixou o cargo em 2000, quando venceu o pleito a prefeito de Santa Maria. Foi reeleito em 2004. Em 2010, obteve vaga na Assembleia Legislativa, com 64.143 votos. Integra a corrente Unidade e Luta Democrática no PT.