Artigo – No Dia do Professor e da Professora, deveríamos fazer a lição de casa

Por Valdeci Oliveira –

Nesta sexta-feira, 15, comemoramos o Dia do Professor e da Professora. E para lembrar a data deveríamos cumprir o estabelecido no decreto federal nº 52.682, assinado pelo ex-presidente João Goulart em outubro de 1963, que prevê ao ministro da Educação promover anualmente concursos alusivos à data e à pessoa do professor.

Diz ainda que os estabelecimentos de ensino devem promover, com a participação dos alunos e suas famílias, solenidades que enalteçam a função dos professores na sociedade.  A data escolhida por Jango foi em referência à publicação de um decreto, este assinado por Dom Pedro I em 1827, estipulando que todas as cidades brasileiras contassem com escolas.

Deveríamos fazer mais, e não só hoje. Deveríamos exigir de nossos governantes a aplicação fiel dos recursos previstos em lei, na busca por uma educação de qualidade e com acesso universal. Deveríamos ir às ruas exigir o cumprimento do capítulo II da nossa Constituição, que coloca a educação ao lado da saúde, alimentação, trabalho e outros como direitos sociais básicos.

No Dia do Professor e da Professora, deveríamos lutar com todas as nossas forças pela revogação imediata da Emenda Constitucional 95, a lei do teto, que aprovada no governo Michel Temer para atender aos interesses do sistema financeiro e da nossa dita “elite econômica” estipulou que, a partir de 2018, a União tem como obrigação apenas investir o mesmo valor de 2017, acrescentando ao cálculo o índice da inflação do ano anterior medida pelo IPCA.

A medida significa que os recursos destinados à Educação (assim como os da Saúde e outras áreas essenciais do serviço público), que já não eram ideais, não darão conta do aumento – mesmo o vegetativo – das necessidades do povo brasileiro, não acompanharão o crescimento que porventura o nosso PIB venha a ter, não receberão nenhum acréscimo real. E por longas duas décadas.

Deveríamos dar ouvidos à Organização das Nações Unidas (ONU), que através da Unesco, sua agência voltada à Educação, Ciência e Cultura, e da Organização Internacional do Trabalho (OIT), sua congênere nas questões laborais, criou, há 55 anos, com objetivo de abrir os olhos dos países e chamar a atenção da sociedade, o Dia Mundial dos Professores, comemorado em 5 de outubro. Queria, com isso, que as nações atentassem para a importância da profissão, defendendo “melhorias significativas ao trabalho dos docentes em questões pedagógicas e profissionais”.

A grande contradição é que, nesta nobre profissão, disparada uma das mais admiradas pela sociedade, convivem, na sua maioria, principalmente no setor público, homens e mulheres vivendo com baixos salários, trabalho excessivo, condições precárias, falta de material didático e acesso restrito à qualificação profissional. Ao mesmo tempo que enaltece a função de educador, essa mesma sociedade, ou parte significativa dela, não se mobiliza, não é tocada pela defesa da causa e adota, em seu dia-a-dia, discursos contrários à gênese do aprender, escolhe políticos ou partidos que preferem responder ao mercado do que ao direito ao conhecimento. Uma sociedade que, por vezes, acredita que os problemas enfrentados pela Educação dizem respeito exclusivamente àqueles que foram eleitos com o voto popular.

Noves fora, o que temos é um reflexo de nossas escolhas e das escolhas daqueles que, tendo em mãos mecanismos para melhorar as condições de trabalho dessa categoria, não o fazem. Levantamento do Dieese “Remunerações iniciais nas carreiras do magistério nas redes estaduais do Brasil”, de março de 2020, mostrou que o RS e mais 15 estados pagam aos professores menos que R$ 2.886,24 por 40 horas semanais. Mas, diferentemente dos outros, aqui, o magistério está há sete anos sem qualquer reajuste na remuneração.

O RS é um espelho do Brasil e vice-versa. Enquanto país, temos o pior salário pago a professores que atuam no ensino médio no mundo, segundo a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) em pesquisa feita em 46 países. Aqui, a média salarial é 13% menor do que a da América Latina e quase metade em relação aos 38 países ricos e integrantes da Organização. E enquanto isso, os professores e professoras brasileiros, assim como demais servidores, são laureados com uma proposta de emenda à Constituição, a PEC 32, que, se aprovada, irá tirar ainda mais direitos e investimentos.

Apesar do descaso, mesmo durante a pandemia, e muitos com recursos próprios, os nossos educadores e educadoras se reinventaram, supriram as carências de uma realidade nada justa com o ensino público, já esgualepado antes e fruto das políticas públicas governamentais – ou melhor, da falta delas. Em muitos casos, substituíram o Estado e garantiram o próprio trabalho, mas não sem a angústia de ver o descaso do governo para com os alunos sem acesso remoto.

Por isso, viva quem educa, luta e transforma. E que façamos logo a lição de casa.

Artigo originalmente publicado no site www.claudemirpereira.com.br

Imagem: SINTE/SC