Artigo – A volta por cima da cultura brasileira

Por Valdeci Oliveira

Termina na próxima segunda-feira, 11 de dezembro, o prazo para que municípios e consórcios públicos intermunicipais façam, na plataforma TransfereGov, o cadastro dos seus planos de ação e possam acessar os recursos da Política Nacional Aldir Blanc de Fomento à Cultura (PNAB). Assim, nos próximos dias, é importante que tanto a classe artística (da produção a execução) quanto a sociedade como um todo cobrem e exijam dos gestores públicos que suas cidades participem desta que é considerada a maior e mais estruturante política cultural montada na história brasileira. É sempre bom termos em mente que o setor, além de ter sido ignorado nos últimos anos, foi o primeiro a parar por conta do cumprimento das medidas restritivas no início da pandemia da covid-19 e o último a voltar a ter suas atividades normalizadas quando esta arrefeceu e o tal ‘novo normal’ passou a fazer parte da nossa vida. E aqui no estado, não fossem algumas prefeituras, o setor teria ficado à míngua se dependesse exclusivamente do governo gaúcho para tocar sua vida em frente. Alguns levantamentos pontuais mostram que, no Rio Grande do Sul, a cultura e a economia criativa são responsáveis pela geração de mais de 410 mil empregos. Eu, como ex-prefeito, sei que, com apoio e financiamento, esse número pode ser consideravelmente maior.

Agora, diferentemente do ano passado, não se trata de uma ajuda emergencial, mas uma política pensada para estruturar o sistema federativo – que envolve a relação entre municípios, estados e União – de financiamento à cultura com repasses de forma continuada. Como bem explica uma cartilha elaborada pelo Ministério da Cultura, estados e municípios poderão implementar ações públicas em editais e chamamentos abertos para o público que trabalha na área cultural ou executar os recursos nas políticas culturais locais de maneira direta.

O objetivo do Ministério da Cultura é, por meio do PNAB, garantir investimentos na ordem de R$ 15 bilhões em ações e projetos culturais em todo o território nacional nos próximos quatro anos. Neste plano ambicioso quanto necessário, nós do RS poderemos acessar algo em torno de pouco mais de R$ 150 milhões, sendo R$ 67 milhões pelo governo para a construção de CEUs da Cultura, e R$ 84 milhões para os municípios que cadastrarem seus planos de ação. Os CEUs são uma política pública que deu bons resultados nos governos anteriores do presidente Lula e Dilma, mas que foram abandonados pelos seus sucessores. Tratam-se de centros culturais cujo tamanho pode variar de 300 a 500m², tendo sua utilização formatada junto às comunidades atendidas, a partir de critérios e quesitos, podendo variar conforme as respectivas potencialidades e necessidades locais.

A lei que criou a Política Nacional Aldir Blanc de Fomento à Cultura determina que o Governo Federal destine R$ 3 bilhões por ano ao segmento cultural, ao longo de 5 anos (2023 a 2027). Deste total, R$ 1,5 bi é alocado aos governos municipais e outro montante de mesmo valor aos governos estaduais. Essa política, depois de enfrentar e vencer as resistências e entraves impostos pela gestão federal anterior, acabou sendo aprovada pelo Congresso. Mesmo com o aval dos deputados e senadores, quando foi à sanção do hoje ex-presidente Bolsonaro, como que querendo passar um recado à classe artística, também escolhida pela gestão como uma das vilãs dos bons costumes, este tentou, via Medida Provisória, retirar inúmeros elementos considerados fundamentais por quem, de norte a sul, produz e vive da cultura. O pior só não aconteceu porque, provocado, o Supremo Tribunal Federal (STF), novamente, o impediu de mais uma asneira (e aqui vale o trocadilho).

Mas isso é passado, sendo importante apenas que não nos esqueçamos dele e assim evitemos a repetição de erros e enganos. O presente tem outros ares. O presente respira democracia, inclusão e desenvolvimento, cujos resultados podem e devem ser compartilhados com e por todos. Como disse a própria ministra da Cultura, Margareth Menezes, o PNAB é fruto do diálogo, da pluralidade de vozes e da diversidade nacional.

A Política Nacional Aldir Blanc de Fomento à Cultura (PNAB) vai além do correto e sempre necessário entendimento de que o acesso aos bens e serviços culturais é um direito social básico e, por isso mesmo, uma obrigação do Estado. Ela busca potencializar os grupos culturais já existentes nos territórios e comunidades do país e estabelece um novo paradigma na relação das cidades e dos estados com o governo Central. É uma relação de respeito, de participação e de envolvimento. E isso merece aplausos e incentivo.