Democracia fortalecida no Brasil

Protesto contra a ditadura no Rio, em 1964: a foto de Evandro Teixeira é uma das imagens mais reproduzidas do período
Protesto contra a ditadura no Rio, em 1964: a foto de Evandro Teixeira é uma das imagens mais reproduzidas do período

Há 50 anos, no Brasil, eu não poderia escrever e publicar um artigo como este, cujo tema é democracia, em um veículo de comunicação. Há 50 anos, no Brasil, você, se opinasse sobre a política, a economia ou a cultura, estaria correndo risco de prisão, tortura ou coisa pior. Nesta semana, quando os “Anos de Chumbo” completaram cinco décadas é preciso lembrar e descomemorar uma das passagens mais sombrias da história do país. Ao todo, o Brasil passou longos 21 anos sob a égide de uma ditadura que asfixiou liberdades, reduziu famílias e ainda sufocou o desenvolvimento nacional. Apesar das recordações envoltas em sangue ou lágrimas que o período naturalmente cativa, a sociedade brasileira não tem o direito de deixar que essas lembranças sejam simplesmente apagadas do consciente coletivo ou minimizadas. É dever das gerações que conviveram com o regime de exceção e das gerações subsequentes recordarem o que se sucedeu entre o início da década de 60 e o ano de 1985. É preciso lembrar para não deixa repetir. Felizmente, essa frase, junto com o bordão “Golpe nunca mais”, já se transformou em viral nas redes sociais e na Internet. Felizmente, marchas organizadas recentemente para defender o “legado” e até, pasmem, o retorno da ditadura fracassaram retumbantemente e atraíram um número ínfimo de seguidores, o que mostra que a esmagadora maioria dos cidadãos e cidadãs não quer mais mordaças.

Tão importante quando lembrar e descomemorar o golpe, é, ao meu ver, saudar, reforçar, e atualizar a defesa da democracia no nosso território, como uma conquista que não merece um milímetro de retrocesso. Se durante 21 anos os nossos sonhos foram calados, como afirmou, nesta semana, a presidenta Dilma Rousseff , ela própria uma vítima da ditadura, hoje os anseios do povo brasileiro têm vez e voz. Depois de 1985, elegemos seis presidentes da Repúblicas através da soberania popular, sendo eles de diferentes partidos políticos e egressos também de diferentes movimentos organizados do nosso país. Nossa imprensa tem liberdade para cumprir o trabalho essencial de informar à população e nossa gente e nossos trabalhadores podem, a qualquer momento e a qualquer tempo, respectivamente, exercerem o direito de manifestação e de greve. Temos, nesse período de democracia e liberdade, conquistas sociais, econômicas e institucionais muito vigorosas e que projetam um futuro de ainda mais desenvolvimento e inclusão e de muito menos pobreza e falta de oportunidades.

É claro que uma democracia ainda jovem como a nossa ainda precisa de aperfeiçoamentos. O próprio sistema eleitoral que elege os representantes do povo é reconhecidamente anacrônico, mercantilista e fomentador da nefasta prática da corrupção. Isso precisa mudar e melhorar. Mas esse e outros avanços que sabidamente precisamos fazer não virão com intervenções militares ou golpes. Virão com mais democracia. A frase é do sociólogo português Boaventura de Sousa Santos: é preciso, sempre, democratizar a democracia.

Artigo do deputado Valdeci publicado no Jornal A Razão desta quinta (03).